Ações Penais Privadas, Renúncia, Perdão e Perempção

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CARACTERÍSTICAS E PRINCÍPIOS NAS AÇÕES PENAIS PRIVADAS

CONCEITUAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS PRIVADAS

As ações penais privadas são aquelas nas quais o direito de punir continua sendo do Estado, pois este detém o monopólio do uso da força, mas a legitimidade para propor a ação penal pertence ao ofendido ou seu representante legal, ressaltando-se que estes serão representados no processo por meio de advogado.

A diferença em relação à ação penal pública condicionada à representação é que, nesta, o bem jurídico violado é eminentemente público, mas a lei condiciona o início do processo à manifestação de vontade dos particulares, até mesmo porque a ação é ajuizada e processada pelo MP. Nas ações penais privadas, por sua vez, o bem jurídico violado é eminentemente privado, razão pela qual todo o processo fica a cargo dos particulares.

Outra característica relevante das ações penais privadas é a sua nomenclatura específica. A inicial acusatória é chamada de queixa-crime. O autor da ação é denominado como querelante e o acusado é chamado de querelado.

A ação penal privada poderá ser ajuizada, em regra, pela vítima ou por seu representante legal, no prazo de 6 (seis) meses contados do conhecimento do autor do crime. Ressalve-se que a existência de inquérito investigativo do fato não interrompe ou suspende esse prazo. Caso o ofendido faleça sem ajuizar a queixa crime, tal direito será transferido ao seu cônjuge, companheiro, ascendente, descendente ou irmão.

Alguns exemplos de crimes processados por meio de ação penal privada são os crimes de calúnia, injúria, difamação, exercício arbitrário das próprias razões desde que praticado sem violência, fraude à execução e dano.

PRINCÍPIOS NAS AÇÕES PENAIS PRIVADAS

As ações penais privadas são regidas pelos princípios da:

  • oportunidade, pelo qual tem-se que o ofendido possui a faculdade de propor, ou não, a ação, de acordo com a sua conveniência – constitui contraponto ao princípio da obrigatoriedade que rege as ações penais públicas, pois, ainda que preenchidas todas as condições da ação, o ofendido poderá optar pelo não processamento do crime, podendo, inclusive, decidir expressamente se o ofensor será preso, mesmo que a autoridade policial se depare com uma situação de flagrante direito de ação privada. (art. 5º, § 5º, CPP);
  • disponibilidade, pelo qual o ofendido pode prosseguir, ou não, até o fim (sentença), na ação penal privada, pois dela poderá dispor, dando causa à extinção do processo por meio do perdão ou da perempção – constitui contraponto ao princípio da indisponibilidade das ações penais públicas;
  • indivisibilidade, pelo qual a queixa crime deverá ser oferecida contra todos os autores do crime, ou seja, o ofendido não poderá escolher, dentre os ofensores, qual irá processar, podendo escolher apenas se irá processar todos os ofensores ou nenhum deles.

ESPÉCIES DE AÇÕES PENAIS PRIVADAS

As ações penais privadas dividem-se em três espécies: a ação penal privada propriamente dita, a ação penal privada personalíssima e a ação penal privada subsidiária da pública.

AÇÃO PENAL PRIVADA PROPRIAMENTE DITA

A ação penal privada propriamente dita é aquela cuja legitimidade ativa para propositura da queixa crime pertence ao ofendido ou seu representante legal, devendo ser proposta no prazo de 6 (seis) meses contados do conhecimento do ofensor pela vítima.

AÇÃO PENAL PRIVADA PERSONALÍSSIMA

No caso da ação penal privada personalíssima, a legitimidade ativa para propositura da queixa crime pertence exclusivamente ao ofendido, não havendo possibilidade de que seja estendida ao representante legal ou ao cônjuge, companheiro, descendente ou irmãos.

Portanto, se o ofendido vier a falecer, haverá a extinção da punibilidade do criminoso, pois ninguém mais poderá oferecer a queixa crime no lugar do falecido.

Existe apenas um crime no ordenamento jurídico brasileiro que se processa mediante ação penal privada personalíssima, qual seja, o crime de induzimento a erro essencial ou ocultação de impedimento, previsto no artigo 236, parágrafo único, do CP.

 ATENÇÃO AOS TERMOS! O erro essencial seria uma característica que um cônjuge apresenta e que o outro desconhece; contudo, se essa característica fosse conhecida desde o início, o casamento não ocorreria. A ocultação de impedimento, por sua vez, trata das pessoas que são impedidas de casar, mas que, ainda que conhecendo tal proibição, casam-se da mesma forma. O prazo de 6 (seis) meses para oferecimento da queixa crime, em ambos os casos, começa a correr do trânsito em julgado da anulação do casamento.

AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA

A ação penal privada subsidiária da pública funciona como instrumento de controle da ação do MP, com status de direito fundamental dos cidadãos, por expressa previsão do artigo 5º, inciso LIX, da CRFB, evitando que os promotores e procuradores desrespeitem o prazo legal para o oferecimento da denúncia ou requerimento de arquivamento do inquérito ou pedidos de novas diligências.

Nos casos em que o suspeito da prática de um crime de ação penal pública está preso durante o inquérito, o MP tem prazo de cinco dias para oferecer a denúncia, requerer arquivamento ou pedir novas diligências; nas hipóteses em que o suspeito estiver solto durante o inquérito, o prazo para realizar tais atos será de 15 (quinze) dias.

Como forma de controlar a atuação ministerial, se tais prazos forem desrespeitados, o particular poderá ajuizar uma ação penal privada subsidiária da pública, funcionando, esta, como se fosse uma denúncia.

Portanto, somente caberá ação penal privada subsidiária da pública nos crimes que se processam mediante ação penal pública, desde que haja desídia por parte do representante do MP.

A ação penal privada subsidiária da pública deverá ser proposta no prazo de 6 (seis) meses, contados do fim do prazo de cinco ou quinze dias que o MP tem para promover os atos supracitados. Entretanto, o MP intervirá em todos os atos do processo tendo em vista que a ação penal, originariamente, era pública.

O representante do MP poderá, inclusive, apresentar recurso caso o autor da ação penal privada substitutiva não o faça.

RENÚNCIA, PERDÃO E PEREMPÇÃO

COMPARAÇÃO ENTRE RENÚNCIA E PERDÃO

A renúncia, o perdão e a perempção possuem a mesma natureza jurídica, qual seja, de causa de extinção da punibilidade, de acordo com o estipulado no artigo 107 do CP. Isso porque impedem a punição do autor do crime.

A renúncia retira o direito de representação e o direito de apresentar queixa crime, ou seja, por escolha daquele a quem seria facultado o ajuizamento da ação, impede-se o início da ação penal pública condicionada à representação, uma vez que esta tem natureza jurídica de condição de procedibilidade e é necessária para que o MP possa oferecer a denúncia.

Havendo a renúncia ao direito de apresentar a queixa crime, o ofendido sequer permite que o processo penal se inicie, evitando que o autor do crime seja punido. Sendo assim, a renúncia poderá exercer efeitos na ação penal pública condicionada à representação e na ação penal privada.

O perdão, por sua vez, constitui demonstração de que o ofendido superou o trauma causado pelo delito e não mais deseja a punição do autor do crime. Contudo, por expressa previsão legal, o perdão somente é cabível nos casos de crimes processados por meio de ação penal privada.

Quanto ao momento em que podem ocorrer, a renúncia ao direito de representação e de oferecer a queixa crime poderá ser invocado pelo ofendido antes do início do processo penal. Não é possível renunciar após esse momento (início do processo penal) porque a ação penal pública, ainda que condicionada à representação, é de titularidade do MP, o qual está sujeito ao princípio da indisponibilidade – uma vez oferecida a denúncia, o representante do MP deverá tocar o processo até a sentença.

Fundamenta-se essa impossibilidade de renunciar à representação após o início do processo penal por uma questão lógica – não seria possível renunciar a um direito já exercido. Desse modo, para evitar a punição do autor do crime, uma vez oferecida a queixa crime, o ofendido poderá somente valer-se do perdão ou da perempção.

Tanto a renúncia quanto o perdão poderão ser expressos ou tácitos. Se expressos, não existirão dúvidas de sua existência, porque o ofendido ou seu representante legal manifestaram-se de modo incontroverso acerca do desejo de não representar ou de não ajuizar a queixa crime.

Por outro lado, a renúncia e o perdão serão tácitos nas hipóteses em que o ofendido ou seu representante legal praticarem atos incompatíveis com o desejo de que o autor do crime seja punido, como, por exemplo, convidar o autor do crime para sua própria festa de aniversário. O ofensor poderá valer-se de todos os meios de prova lícita para demonstrar que houve a renúncia ou o perdão tácitos.

No que tange à aceitação pelo autor do crime, a renúncia é um ato unilateral, ainda que não personalíssimo, cabendo ao ofendido ou seu representante legal. Logo, o autor do crime não será intimado para se manifestar sobre a renúncia.

De modo diverso, o perdão é um ato bilateral, o qual exige a intimação do autor do crime para que ele aceite ou recuse o perdão no prazo de 3 (três) dias. Caso não se manifeste, a lei presume a aceitação do perdão. A justificativa para a necessidade de aceitação do autor não é que este poderia escolher ser punido pelo crime, ao invés de ser perdoado, por ter consciência de que errou (seria utópico, não?). É que algumas pessoas não desejam uma sentença de extinção da punibilidade, mas sim uma sentença que as julguem inocentes – por isso perdão pode ser recusado. Ele presume que houve, sim, a prática criminosa.

Tanto a renúncia quanto o perdão são regidos pelo princípio da indivisibilidade. Portanto, caso mais de um sujeito cometa crime contra a vítima, se o ofendido perdoar ou renunciar à queixa a apenas um dos autores do crime, todos serão beneficiados, pois haverá extensão dos efeitos.

 

RENÚNCIA

PERDÃO

CABIMENTO

Ações penais privadas

Ações penais públicas condicionadas à representação

Ações penais privadas

MOMENTO

Antes do início do processo

Após o início do processo

FORMA

Expresso/tácito

Expresso/tácito

ACEITAÇÃO

Independe

Depende

EFEITO EXTENSIVO

Presente

Presente

PEREMPÇÃO

A perempção também possui natureza jurídica de extinção da punibilidade, constituindo punição à inércia do querelante em um processo que envolva alguma das ações penais privadas, exceto no caso da ação penal privada subsidiária da pública. Nesta, se o querelante restar inerte, o MP reassumirá a titularidade da ação impedindo a perempção.

Tendo em vista que a perempção se opera em razão da desídia do autor da ação, ela só ocorrerá durante o processo penal, ou seja, após o oferecimento da queixa crime. Existem quatro causas para sua ocorrência, as quais estão previstas no artigo 60 do CPP.

A primeira hipótese de perempção ocorrerá quando, após o início da ação penal privada, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 (trinta) dias seguidos. Também haverá perempção quando, falecendo o querelante ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo para prosseguir no processo dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo – são elas: o cônjuge, companheiro, ascendente, descendente ou irmão (Sigla para lembrar! CADI).

Ocorrerá perempção, ainda, se o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais. Por fim, outra causa de perempção é a extinção da pessoa jurídica, se for o caso de querelante que seja pessoa jurídica, sem que seja deixado sucessor.

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