Quem deve ser apresentado?

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Agora veremos detalhadamente quem deve ser apresentado à audiência de custódia, ou seja:

  • Quem já foi preso tem direito à audiência?

  • E os menores?
  • E os deputados e senadores?
  • O que a Resolução 213 do CNJ e outros marco normativos esclarecem sobre isso? 

A audiência de custódia vincula-se de forma inerente com a prisão em flagrante, uma vez que é nessa modalidade de cerceamento da liberdade, realizada independentemente de decisão judicial, que as ocorrências de tortura e maus-tratos praticados por policiais acabam ocorrendo com maior frequência. Assim, não existem grandes questões quanto à prisão em flagrante (vide art. 301 e 302 do CPP). Uma vez capturado, o indivíduo será levado à delegacia de polícia para que o flagrante seja formalizado e, posteriormente, o preso e o auto de prisão em flagrante serão remetidos à realização da audiência de custódia, conforme o previsto no art. 1º da Resolução 213/2015 do CNJ:

Art. 1º Determinar que toda pessoa presa em flagrante delito, independentemente da motivação ou natureza do ato, seja obrigatoriamente apresentada, em até 24 horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial competente, e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão ou apreensão.

E o preso por mandado judicial?

A relação da audiência de custódia com a prisão em flagrante é facilmente compreensível, como exposto a cima, em razão dos abusos que podem ocorrer no momento da captura de um indivíduo. Entretanto, seria possível -ou mesmo necessária- a realização de tal procedimento nas hipóteses em que um magistrado, após analisar um caso concreto, decreta a prisão preventiva e a prisão temporária de um suspeito?

Sobre este ponto, não há consenso na doutrina. Para alguns autores, a audiência de custódia seria incompatível com as prisões decorrentes de mandado judicial, posto que, nestes casos, ela não atenderia a finalidade alguma. Exemplo: quando o MP descobre que um suspeito está destruindo provas ou ameaçando testemunhas, para resguardar o sucesso do processo penal, ele requer (ao magistrado do caso) a decretação da prisão preventiva do suposto autor do crime. O juiz, concordando com o pedido, reconhece o periculum libertatis, fato que exclui a possibilidade de concessão de quaisquer outras medidas não prisionais, sendo, então, perda de tempo a apresentação pessoal do preso ao juiz competente. Entretanto, ao se analisarem os tratados internacionais que versam sobre o tema, é facilmente constatável que tais instrumentos normativos não restringem a aplicação da audiência de custódia. Ao contrário, esses instrumentos procuram expandi-la ao máximo. A CADH, em seu art. 7º, item 5, determina que será apresentada pessoalmente a um juiz toda pessoa detida ou retida.

Apesar da polêmica, a Resolução 213/2015 do CNJ procura maximizar a audiência de custódia, pois determina, em seu art. 13, a sua realização em decorrência de quaisquer prisões:

Art. 13. A apresentação à autoridade judicial no prazo de 24 horas também será assegurada às pessoas presas em decorrência de cumprimento de mandados de prisão cautelar ou definitiva, aplicando-se, no que couber, os procedimentos previstos nesta Resolução.

E quem já foi preso?

No que se refere aos indivíduos que já estavam presos quando a audiência de custódia passou a ser vigente, o art. 15, parágrafo único, da Resolução, determina:

Art. 15, parágrafo único. No mesmo prazo será assegurado, às pessoas presas em flagrante antes da implantação da audiência de custódia que não tenham sido apresentadas em outra audiência no curso do processo de conhecimento, a apresentação à autoridade judicial, nos termos desta Resolução.

Logo, a audiência de custódia funcionará da seguinte forma: se o indivíduo fora preso antes da implementação da Resolução 213/2015, ele deveria ser apresentado ao magistrado que cuida do seu caso no prazo geral de 24 horas; entretanto, tal apresentação seria descartada caso ele já tivesse participado de alguma audiência antes, durante o processo. Isso se deve ao fato de que, durante a audiência, o preso já poderia ter narrado eventuais práticas de tortura ou maus-tratos cometidos pelos policiais, bem como o magistrado já poderia concedido a liberdade provisória caso tivesse entendido que o preso cumpria com os requisitos legais (o CPP não aborda expressamente os requisitos legais da liberdade provisória, mas trata expressamente dos requisitos da prisão preventiva. Vide arts. 311 e 312 da referida lei).

E os menores?

A audiência de custódia vincula-se ao tema das prisões independentemente da natureza destas. Entretanto, existe um grupo de indivíduos que cometem fatos típicos e antijurídicos os quais, apesar de sua natureza ilícita, não são considerados crimes, mas atos infracionais equiparados a crimes. Tais individuos podem ser internados, tendo seu direito de ir e vir cerceado, em instituições próprias. Falamos dos menores infratores, ou seja, adolescentes maiores de 12 anos e menos de 18 anos de idade. Assim, resta a pergunta: a audiência de custódia é aplicável ao procedimento penal exigido pelo ECA?

O procedimento infracional dos menores funciona da seguinte forma: quando um menor é apreendido em flagrante pela prática de um ato infracional de reduzida gravidade, ele poderá ser liberado e confiado, pela própria autoridade policial, aos pais ou a outro responsável legal. Entretanto, em se tratando de infração penal grave, caberá a sua apresentação ao MP, ainda no mesmo dia. Na sede do Parquet, haverá a oitiva informal, oportunidade que o MP poderá beneficiar o menor com o instituto da remissão, sendo esta sua competência exclusiva, a qual apresenta natureza jurídica de causa de exclusão do processo. Caso o MP entenda pela necessidade de ajuizar ação contra o menor, tal fato, por si só, não enseja apreensão provisória, sendo necessária a decisão judicial nesse sentido. Se ocorrer a internação provisória, todo o processo deverá terminar no prazo de 45 dias, sob pena de o menor ser liberado imediatamente. Convém destacar ainda que, nos casos em que houver representação (similar a denúncia no CPP) do MP, o menor passará por uma audiência de representação e, posteriormente, por uma audiência de instrução, na qual as provas serão produzidas.

Sobre a necessidade de audiência provisória no ECA, a doutrina se divide. Alguns acham que o procedimento do ECA é mais benéfico ao menor do que a realização da audiência de custódia, posto quer ele pode ser liberado aos pais desde o início. Outros doutrinadores entendem que todo o procedimento infracional do ECA deveria ser revogado e uma nova norma deveria ser editada inserindo a audiência de custódia. Por fim, uma terceira corrente entende que a apresentação do menor ao MP equivaleria a uma audiência de custódia. Enfim, nada está certo sobre esse tema e a Resolução 213/2015 silencia-se sobre esse assunto. Na prática, existem estados realizando a audiência de custódia para os menores misturando as regras do ECA com as da Resolução do CNJ. Por outro lado, a maioria dos estados sequer aplica o instituto para os adolescentes infratores.

E os deputados e senadores?

De acordo com a CF/88, os parlamentares apresentam uma série de benefícios inerentes a seu cargo. Um desses benefícios é denominado imunidade formal ou incoercibilidade formal relativa, a freedom from arrest, que assegura aos deputados e senadores eleitos, nos termos do art. 53, parágrafo 2º da Constituição, a impossibilidade de serem presos “desde a expedição do diploma, exceto em caso de flagrante de crime inafiançável”.

Assim, caso pratique um crime inafiançável e incida em uma das hipóteses de flagrante do art. 302 do CPP, o parlamentar será detido, sendo os autos enviados, no prazo de 24 horas, à casa legislativa à qual ele pertença para que se decida pela manutenção ou relaxamento da prisão, em decisão tomada pela maioria dos membros da casa.

Ora, caso um parlamentar pratique um ato que dê ensejo à prisão em flagrante, haverá a realização da audiência de custódia?

Para a doutrina majoritária, a Resolução 213/2015 não seria aplicável aos casos de parlamentares presos, uma vez que eles gozam de prerrogativas específicas previstas na Constituição federal, cuja hierarquia é superior a qualquer norma internacional ou interna, de acordo com o entendimento do STF. No caso de prisão em flagrante de parlamentares, destarte, deverá ser seguido o disposto no art. 53, parágrafo 2º, CF/88, não havendo necessidade da audiência de custódia.

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