Introdução e Declaração Universal de 1948

O Direito Internacional dos Direitos Humanos é ramo do Direito Internacional que teve seu maior destaque na segunda metade do século XX (pós-guerras), período no qual a pessoa humana começou a ser aceita como sujeito de Direito Internacional, ao lado dos Estados e das Organizações Internacionais.

HISTÓRICO

Considera-se como primeira relevante manifestação sobre os Direitos Humanos a Carta Magna da Inglaterra de 1215. Tal documento surgiu na Inglaterra em meio a um contexto histórico no qual os senhores feudais, aborrecidos com os abusos na taxação de impostos e com as sucessivas derrotas inglesas frente à França, exigiram do Rei João Sem Terra (lembram-se dele?) que houvesse a limitação do poder do soberano quanto a        aumento de impostos e alteração de leis, fazendo com que o rei necessitasse de prévia aprovação do Conselho para realizar tais atos.

Cronologicamente, com o Renascimento e a Reforma Protestante, surgiram os Estados Nacionais europeus e a figura do monarca absolutista, cujo poder ilimitado resultou em diversas violações aos direitos humanos da população “não nobre”. Assim, no século XVII, inicia-se um período de questionamento do Estado Absolutista, culminando na ocorrência das revoluções liberais inglesa, americana e francesa, as quais representam a primeira clara afirmação histórica dos direitos humanos. Em relação aos documentos feitos nesse período das revoluções liberais, destacam-se:

  • Declaração Inglesa de 1689: Também conhecida como “Bill of Rights”, estabeleceu as bases da monarquia parlamentar inglesa, institucionalizou a separação de poderes, bem como garantiu a liberdade de imprensa, liberdade individual e a proteção à propriedade privada. Entretanto, contrariamente a essas liberdades, a Declaração Inglesa de 1689 impôs uma religião oficial ao país, clara violação à liberdade dos indivíduos quanto à escolha de suas religiões.
  • Declaração de Independência dos EUA: Elaborada em 1776, apesar de não apresentar um rol de direitos, ressaltou em seu texto o direito à igualdade e liberdade dos indivíduos, bem como o direito político de autodeterminação dos seres humanos para escolherem livremente seus governantes.
  • Declaração Francesa sobre os Direitos do Homem de 1789: Influenciada pelo pensamento do jusnaturalismo, tal documento representou um marco para a proteção dos direitos humanos no plano nacional, destacando-se, entre os direitos previstos, o direito a propriedade e liberdade, a igualdade de todos perante a lei, a soberania popular, sistema de governo representativo, entre outros.

Conforme mencionado, os documentos elaborados a partir das revoluções liberais dos séculos XVII e XVIII, em especial a Declaração Francesa sobre os Direitos do Homem (1789), foram influenciados pelo movimento filosófico do jusnaturalismo europeu, marcado pela consagração da razão e laicidade das normas de direito natural. Assim, destaca-se que, na visão dessa corrente do jusnaturalismo contratual, os direitos humanos são atemporais e inerentes à condição humana, justificando-se, assim, a necessidade de proteção aos direitos humanos, os quais, até os séculos XVII e XVIII careciam muito de devido atendimento.

Entretanto, até o período anterior à Segunda Guerra Mundial, a proteção aos direitos humanos era de natureza interna dos países, normatizados nas Constituições liberais de determinados Estados ou em normas internacionais esparsas referentes a direitos específicos. Em face das diversas atrocidades e violações aos direitos humanos praticadas na Segunda Guerra, surgiu a necessidade de uma universalização e normatização desses direitos no âmbito do Direito Internacional.

Nesse sentido, em 1945, foi criada a Organização das Nações Unidas, através da Carta de São Francisco, a qual conferiu aos direitos humanos uma estatura constitucional no âmbito do ordenamento jurídico internacional.

Em 1948, foi adotada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, considerada o marco normativo mais importante no tocante à proteção desses direitos. A referida Declaração explicita o rol dos direitos humanos internacionalmente protegidos, dentre os quais tem-se os direitos políticos e liberdades civis (1ª geração) e os direitos econômicos, sociais e culturais (2ª geração). Destaca-se que os chamados direitos de 1ª geração são aqueles relacionados à defesa das liberdades individuais perante o Estado, a fim de que seja definida a área de domínio do Poder Público e a de domínio individual. Já os direitos de 2ª geração têm como essência a preocupação com as necessidades do ser humano, exigindo a proteção, por parte dos Estados, da dignidade humana.

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS – 1948

Primeiramente, é necessário analisar a natureza jurídica da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH). Esta não é considerada um tratado, visto que não passou por procedimentos, tanto internos quanto internacionais, essenciais para a celebração de tratados. Assim, considera-se que a DUDH seria uma recomendação das Nações Unidas, adotada na forma de Resolução pela Assembleia Geral das Nações Unidas.

Entretanto, apesar de a DUDH não ser considerada uma declaração stritu sensu por ter sua origem em uma resolução, é inegável sua importância no âmbito da proteção internacional dos Direitos Humanos, sendo a interpretação mais autêntica dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais.

Ademais, reconhece-se que o Direito Internacional, além de tratados ou convenções, é também constituído pelo costumes e princípios gerais de direito. Assim, os direitos definidos na DUDH correspondem ao que o costume e os princípios jurídicos internacionais reconhecem, atualmente, como normas imperativas de Direito Internacional geral, os Jus Cogens. Portanto, tem-se que a DUDH é uma norma de Jus Congens, em razão de sua forma imperativa no âmbito do Direito Internacional, representando, assim, praticamente um “Código Ético” no campo dos Direitos Humanos.

Ainda, alguns juristas entendem que a DUDH é uma extensão da Carta da ONU (Carta de São Francisco) em razão de integrar a referida carta e ser obrigatória para os Estados membros da ONU no sentido de que suas normas internas devem ser compatíveis com a Declaração de 1948.

Além disso, a Corte Internacional de Justiça, em 1980, considerou a DUDH um costume, fornecendo, assim, à Declaração, a mesma força normativa da Carta da ONU, (Destaca-se que o costume também é uma fonte de Direito Internacional). Ressalta-se, ademais, que, pelo fato de a DUDH representar normas costumeiras internacionalmente adotadas e reconhecidas no tocante aos Direitos Humanos, tal Declaração, como já mencionado, integra as normas de Jus Cogens, podendo ser derrogada, por consequência, apenas por normas de Jus Cogens posteriores à DUDH.

Portanto, apesar de a DUDH não ter natureza jurídica de tratado, ela apresenta grande relevância no mundo contemporâneo, já que trouxe novos parâmetros para o Direito Internacional no tocante à legitimação dos Estados Soberanos no campo dos Direitos Humanos.

IMPACTOS DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS -1948

Quanto aos impactos oriundos da DUDH, destaca-se, inicialmente, o papel da referida Declaração como fonte jurídica para tratados sobre Direitos Humanos. Nesse sentido, a DUDH representa um paradigma e um referencial ético no processo de celebração de tratados referentes a esse tema, tanto no contexto dos sistemas globais quanto no dos regionais, fomentando, dessa maneira, a criação de diversos tratados posteriores sobre Direitos Humanos.

Ademais, a DUDH possibilitou o rompimento das concepções anteriores de Direitos Humanos, as quais, até a referida Declaração, baseavam-se historicamente na concepção liberal das Declarações Francesa e Norte-Americana e na concepção social-nacionalista representada na Declaração de Direitos da República Soviética (1920). Dessa forma, a DUDH traz ao contexto internacional uma concepção inovadora em que os direitos humanos apresentam caráter de unidade indivisível, inter-relacionada e interdependente, ou seja, apenas o reconhecimento integral de determinado direito pode gerar a proteção dos demais. Essa nova concepção dos Direitos Humanos encontra-se implícita na Carta da ONU, tendo sido sistematizada e ampliada na DUDH de 1948 e, ainda, reafirmada definitivamente pelos Pactos Universais de Direitos Humanos de 1966 (Pacto sobre Direitos Civis e Políticos; Pacto sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais).

DIREITOS HUMANOS X DIREITOS FUNDAMENTAIS

Destaca-se que a diferença entre os Direitos Humanos e os Direitos Fundamentais está no plano em que estes estão positivados, visto que, nos dois casos, trata-se da proteção da pessoa humana. Assim, tanto os Direitos Humanos quanto os Direitos Fundamentais destinam-se à proteção da pessoa humana, estando os primeiros no âmbito do Direito Internacional e, os segundos, positivados nas Constituições dos Estados, sendo, assim, de âmbito nacional. Quanto ao grau de efetividade, não há que se diferenciar os Direitos Humanos dos Direitos Fundamentais, entretanto, alguns doutrinadores asseveram que os Direitos Fundamentais apresentariam maior grau de efetividade em face da existência de mais instâncias e órgãos, no âmbito nacional de cada país, que têm o poder de fazer com que tais direitos sejam respeitados.

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