A racionalidade limitada

Noções introdutórias

O direito trata os julgadores como seres humanos completamente racionais, capazes de anular toda emoção nas tomadas de decisão dos julgamentos. É o que se denota da Lei Complementar nº 35 de 1979, também conhecida como Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN):  

Como exemplo, vejamos uma citação do art. 35, I, da citada norma:

Art. 35 – São deveres do magistrado: 
I – Cumprir e fazer cumprir com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício; 

E, ainda, observe o dispostos nos artigos 5º e 8º do Código de Ética da Magistratura Nacional, que compartilham a mesma visão sobre o julgador: 

Art. 5º - Impõe-se ao magistrado pautar-se no desempenho de suas atividades sem receber indevidas influências externas e estranhas à justa convicção que deve formar para a solução dos casos que lhe sejam submetidos.

Art. 8º - O magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e Evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito. 

Dessa forma, o julgador deve ser influenciado única e exclusivamente pelas normas abstratas e pelas provas produzidas no processo. 

Visão doutrinária 

Atenta a dificuldade de concretização absoluta do ideal de imparcialidade, a doutrina tece críticas a imposição de deveres hercúleos aos julgadores. Vejamos uma citação de Carlos Maximiliano:

“A ausência de paixão constitui um pré-requisito de todo o pensamento científico. Em verdade, o trabalho do intérprete pode ser viciado, não só pelas causas apontadas, como também por qualquer prevenção, ou simpatia, que o domine, sem ele o perceber talvez, relativamente a parte, por sua classe social, profissão, nacionalidade ou residência, ideias religiosas e políticas”. 

Desse modo, podemos perceber que a legislação brasileira e a doutrina entendem que o direito deve ser objetivo e não subjetivo. E que o juiz deve julgar utilizando seu instinto racional e não emocional. 

Visão tradicional do direito: 

Razão: tem caráter de ordem e lógica. 

Emoção: representa a desordem e a confusão. 

No âmbito jurídico, a razão é mais exaltada, isso porque é uma característica essencial nos julgamentos e tomadas de decisão, ou seja, no processo decisório. E a emoção é dada como uma ameaça para a racionalidade. 

Nesse sentido, destaca-se a seguinte citação do filósofo Hobbes, em sua famosa obra “Leviatã”: 

“As coisas que fazem um bom juiz ou um bom intérprete da lei são (…) em terceiro lugar, ser capaz no julgamento de despir-se de todo medo, raiva, ódio, amor e compaixão”. 

Juiz: razão X emoção 

O filósofo Platão adotava a teoria de alma racional. Ele acreditava que os seres humanos poderiam utilizar a razão como forma de controlar as emoções, norteando-as. Para essa teoria, o filósofo utilizou o paradoxo entre um cocheiro (razão) e o par de cavalos (emoção). 

No entanto, a visão do psicólogo Jonathan Haidt é mais utilizada. Ele embasa seu pensamento utilizando o exemplo do elefante (emoção) e do condutor do elefante (razão): 

“Segurando as rédeas em minhas mãos se, puxando em uma direção ou outra, posso dizer ao elefante para virar, parar ou ir. Posso direcionar as coisas, mas somente quando o elefante não tem desejos próprios. Quando o elefante realmente quer fazer alguma coisa, não sou páreo para ele”. 

Dessa forma, percebemos que no mundo real o entendimento de Haidt é mais aplicável, e também se enquadra melhor no mundo jurídico. Isso porque, os juízes não conseguem ser totalmente racionais em suas decisões e comportamentos. Há momentos em que a emoção passa por cima da racionalidade, deixando pensamentos e opiniões se sobressaírem. 

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