Falta Grave

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Faltas disciplinares

O art. 49 da LEP dispõe que o condenado à pena privativa de liberdade, o condenado à restritiva de direitos e o preso provisório têm um dever de disciplina, ou seja, de colaborar com a ordem e de obedecer às autoridades (art. 44).

As faltas disciplinares são aquelas condutas que afrontam o dever de disciplina. Assim dispõe o art. 49 da LEP:

Art. 49. As faltas disciplinares classificam-se em leves, médias e graves. A legislação local especificará as leves e médias, bem assim as respectivas sanções.

Assim, a LEP só disciplina as faltas graves, enquanto as outras faltas são previstas em normas da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP).

Parágrafo único. Pune-se a tentativa com a sanção correspondente à falta consumada.

 Atenção para isto: a tentativa de cometimento de falta disciplinar é punida mesmo que não tenha sido consumada!

Falta grave

As faltas graves dos condenados à pena privativa de liberdade (PPL) e dos presos provisórios estão previstas no art. 50 da LEP, em rol taxativo:

Art. 50. Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que:

I - incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina;

O exemplo mais claro da hipótese acima é a ocorrência de motim, rebelião.

II - fugir;

Lembrando que a tentativa de fuga é punida como se a fuga tivesse se consumado.

III - possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem;

A hipótese acima é abrangente, podendo englobar quaisquer objetos tradicionalmente usados ou fabricados para ferir. Precisa ser interpretada a situação em face das circunstâncias.

IV - provocar acidente de trabalho;

V - descumprir, no regime aberto, as condições impostas;

O inciso acima deve ser interpretado teleologicamente, ou seja, visando ao objetivo da norma e ao que é realmente possível cumprir, ou não, em face das circunstâncias. Lembrando que a lei previu a existência de albergue especial para recolher em período noturno os apenados com regime aberto, estabelecimentos estes que foram escassamente construídos, fazendo com que tais condenados fiquem, de verdade, em regime domiciliar.

VI - inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei.

Os incisos mencionados acima tratam do dever do condenado de agir com obediência ao servidor, respeito com as pessoas em geral e urbanidade com demais condenados e conduta oposta à fuga ou subversão da ordem e disciplina.

VII – tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo.           (Incluído pela Lei nº 11.466, de 2007)

O HC 190.066 do STJ faz uma interpretação extensiva e caracteriza falta grave também a posse de bateria e acessórios de celular.  No entanto, existem precedentes em sentido diverso. No julgamento do HC 255.569/SP, o STJ considerou que o cabo USB, o fone de ouvido e microfone não são acessórios essenciais ao funcionamento de aparelho de telefonia celular ou rádio de comunicação e, portanto, não se amoldariam à finalidade da norma prevista no art. 50, VII, da Lei 7.210/1984, não devendo sua posse implicar falta grave.

VIII - recusar submeter-se ao procedimento de identificação do perfil genético.

Por fim, também é considerada falta grave a recusa ao procedimento de identificação do perfil genético obrigatório, previsto no art. 9º-A da LEP. A aplicação se dá nos crimes dolosos praticados com violência grave contra a pessoa ou nos crimes hediondos. 

Já as faltas graves dos condenados à pena restritiva de direitos (PRD) são as elencadas no art. 51:

Art. 51. Comete falta grave o condenado à pena restritiva de direitos que:

I - descumprir, injustificadamente, a restrição imposta;

II - retardar, injustificadamente, o cumprimento da obrigação imposta;

III - inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei.

O caput do art. 52 dispõe que a prática de crime doloso também constitui falta grave. Além disso, este dispositivo prevê um regime disciplinar diferenciado para o preso que incorrer nessa hipótese de falta grave:

Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasionar subversão da ordem ou disciplina internas, sujeitará o preso provisório, ou condenado, nacional ou estrangeiro, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características:

I - duração máxima de até 2 (dois) anos, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie;

II - recolhimento em cela individual;

III - visitas quinzenais, de 2 (duas) pessoas por vez, a serem realizadas em instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem de objetos, por pessoa da família ou, no caso de terceiro, autorizado judicialmente, com duração de 2 (duas) horas;

IV - direito do preso à saída da cela por 2 (duas) horas diárias para banho de sol, em grupos de até 4 (quatro) presos, desde que não haja contato com presos do mesmo grupo criminoso;

V - entrevistas sempre monitoradas, exceto aquelas com seu defensor, em instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem de objetos, salvo expressa autorização judicial em contrário;

VI - fiscalização do conteúdo da correspondência;

VII - participação em audiências judiciais preferencialmente por videoconferência, garantindo-se a participação do defensor no mesmo ambiente do preso.

Outras situações que apresentam alta periculosidade são abarcadas pela decretação de regime disciplinar diferenciado, inclusive a liderança de organização criminosa, que importa em cumprimento de pena em estabelecimento federal:

Art. 52. [...]

§ 1º O regime disciplinar diferenciado também será aplicado aos presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros:

I - que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade;

II - sob os quais recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, independentemente da prática de falta grave.

§ 3º Existindo indícios de que o preso exerce liderança em organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, ou que tenha atuação criminosa em 2 (dois) ou mais Estados da Federação, o regime disciplinar diferenciado será obrigatoriamente cumprido em estabelecimento prisional federal.

§ 4º Na hipótese dos parágrafos anteriores, o regime disciplinar diferenciado poderá ser prorrogado sucessivamente, por períodos de 1 (um) ano, existindo indícios de que o preso:

I - continua apresentando alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal de origem ou da sociedade;

II - mantém os vínculos com organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, considerados também o perfil criminal e a função desempenhada por ele no grupo criminoso, a operação duradoura do grupo, a superveniência de novos processos criminais e os resultados do tratamento penitenciário.

§ 5º Na hipótese prevista no § 3º deste artigo, o regime disciplinar diferenciado deverá contar com alta segurança interna e externa, principalmente no que diz respeito à necessidade de se evitar contato do preso com membros de sua organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, ou de grupos rivais.

§ 6º A visita de que trata o inciso III do caput deste artigo será gravada em sistema de áudio ou de áudio e vídeo e, com autorização judicial, fiscalizada por agente penitenciário.

§ 7º Após os primeiros 6 (seis) meses de regime disciplinar diferenciado, o preso que não receber a visita de que trata o inciso III do caput deste artigo poderá, após prévio agendamento, ter contato telefônico, que será gravado, com uma pessoa da família, 2 (duas) vezes por mês e por 10 (dez) minutos.

E atenção para a Súmula 526 do STJ, que dispensa o trânsito em julgado da condenação para reconhecimento da falta grave:

O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato.

Sanções disciplinares

Diante do cometimento de falta grave, a pessoa que praticou a falta poderá sofrer alguma das sanções disciplinares arroladas no artigo 53:

Art. 53. Constituem sanções disciplinares:

I - advertência verbal;

II - repreensão;

III - suspensão ou restrição de direitos (artigo 41, parágrafo único);

IV - isolamento na própria cela, ou em local adequado, nos estabelecimentos que possuam alojamento coletivo, observado o disposto no artigo 88 desta Lei.

V - inclusão no regime disciplinar diferenciado.  (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003)

A regra geral é que a sanção será aplicada conforme a natureza, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato cometido pelo condenado, bem como se considerando a pessoa que cometeu a falta e seu tempo de prisão (art. 57, caput, da LEP).

 Mas cuidado! No entanto, no caso das faltas graves, só poderão ser aplicadas as sanções previstas nos incisos de III a V (art. 57, parágrafo único, da LEP)!

E a falta grave caracterizada por cometimento de crime doloso é sempre punida com o regime disciplinar diferenciado (RDD) (art. 52, caput, da LEP).  Note que o RDD, apesar do nome, não é regime, é sanção disciplinar com as seguintes características:

Art. 52. (…)

I - duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada;

II - recolhimento em cela individual;

III - visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas;

IV - o preso terá direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol.

§ 1o O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade.

§ 2o Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando.

 Atenção: os dois parágrafos do artigo acima descrevem duas hipóteses em que o RDD é aplicado independentemente da existência de uma falta disciplinar.

Efeitos da falta grave

Enquanto a falta leve e média só possuem como consequências as sanções disciplinares, o cometimento de falta grave pode gerar outros efeitos que agravam a pena, quais sejam:

  • Regressão de regime prisional. Antes de tal efeito, deve haver procedimento com oitiva de envolvidos, ampla defesa e assistência de advogado. O diretor do presídio deve dar parecer e poderá já colocar o faltoso em isolamento, se julgar necessário. O procedimento é então remetido à VEC para decisão do juiz. Se houver homologação da falta, então finalmente poderá ser aplicada a regressão de regime.
  • Perda de parte dos dias remidos, em até 1/3 (art. 127 da LEP). Há tese da Defensoria Pública que defende que o juiz poderá decretar a perda de apenas 1 dia e, caso exceda este mínimo, deverá fundamentar de maneira consistente sua decisão.
  • Rebaixamento da conduta carcerária – para má conduta. A conduta carcerária, classificada pelo diretor do presídio, é uma avaliação do comportamento do réu que determina se será ou não possível a sua progressão de regime. Para tal progressão, exige-se o cumprimento do lapso temporal prescrito em lei (requisito objetivo) e a boa conduta carcerária (requisito subjetivo).
  • Impedimento de indulto ou comutação no ano do decreto da falta grave. Tal efeito é controverso. A Defensoria Pública entende que há falta de previsão legal para tanto.
  • Conversão de pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade.

Interrupção de lapso para benefícios (data-base)

A lei exige sempre que o réu cumpra um determinado período (lapso) caso queira acessar seus benefícios, como, por exemplo, 1/6 da pena para progredir de regime (em casos de crime comum). A contagem começa normalmente na data em que o réu é preso (data-base).

Há uma discussão se o cometimento de falta grave interromperia (reiniciaria) o lapso temporal para obtenção de benefícios pelo réu, como a progressão de regime, o indulto e a comutação.  A interrupção faria a contagem zerar e ser reiniciada no dia do cometimento da falta grave, devendo o réu cumprir o mesmo lapso, agora calculado sobre o tempo de pena restante – por exemplo, 1/6 da pena que ainda falta cumprir.

Atualmente, temos três posicionamentos sobre tal tema:

  • STJ: entende que o lapso se interrompe só para progressão de regime prisional. Para o livramento condicional, o indulto e a comutação não haveria interrupção (3ª Seção pacificou o assunto no RESP 1.176.486);
  • STF: entende que se interrompe o lapso para progressão de regime (HC 109.389, Info 678/RHC 116.203, Info 705) e não dispõe sobre o livramento, o indulto e a comutação;
  • Defensoria Pública: entende que não se interrompe o lapso para nada, por falta de expressa previsão legal. É posição minoritária.
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