Princípios do Direito Eleitoral

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Princípio da Anterioridade Eleitoral/Anualidade Eleitoral:

O princípio da Anterioridade Eleitoral se relaciona com o art. 16 da Constituição Federal de 1988, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 4/93:

Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência

Quanto a este artigo, algumas observações precisam ser feitas:

“alterar o processo eleitoral”: qualquer lei que tratar de questões do direito eleitoral alterará o processo eleitoral? O dispositivo é muito vago quanto a isso, mas a maioria da doutrina entende que alterar o processo eleitoral tem um sentido substancial, sendo que essa regra só se aplica às mudanças que a lei fizer no processo eleitoral propriamente dito, devendo tratar-se de algo suficiente para influenciar as eleições, criando obrigações ou restringindo o exercício de direitos. 

Exemplo: suponhamos que o poder legislativo crie duas leis: a Lei 1 permite a prestação de contas simplificada aos partidos que recebem menos de R$ 20.000,00 por mês. A Lei 2 aumenta o prazo mínimo de filiação partidária de 6 meses para 2 anos.  

A lei 1 não traz qualquer alteração para o processo eleitoral em si, ela apenas desobriga os partidos com baixas receitas a fazerem prestações de contas mais minuciosas. Tal medida não tem o condão de desequilibrar as eleições em favor de um partido ou candidato, nem cria obrigações ou limita direitos, por isso, não há bons motivos para que ela só possa ser aplicada 1 ano após sua publicação. Já a lei 2 aumenta o prazo mínimo de filiação partidária para se concorrer à eleição, ou seja, torna mais rígida uma condição de elegibilidade, trata-se de uma verdadeira restrição ao direito de concorrer às eleições.

“entrar em vigor na data de sua publicação”: entra em vigor imediatamente. Não estamos tratando aqui de vacacio legis ou vacância; a vacância é um período que precede o início de vigência de uma determinada lei. No caso da lei que altera o processo eleitoral, não há esse intervalo entre a publicação da lei e o início de sua vigência. Ela entra em vigor imediatamente, mas prestem atenção ao fato de que ela só pode ser APLICADA depois de transcorrido 1 ano dessa data. Assim, a lei permanece em vigor, é válida, mas não surte efeitos, é INEFICAZ.

CASO CONCRETO: Caso da Lei Complementar 135/2010 – Lei da Ficha Limpa: questão que demorou muito pra ser decidida pelo STF. O TSE vinha indeferindo muitas candidaturas com base na Lei da Ficha Limpa e vários candidatos recorreram das respectivas decisões. Nesse sentido temos os recursos extraordinários RE nº 630.147/DF - RE nº 631. 102/PA – RE nº 633.703/MG; segue abaixo um trecho que explica a relação entre a Lei da Ficha Limpa e o princípio da anterioridade:

“LEI COMPLEMENTAR 135/2010, DENOMINADA LEI DA FICHA LIMPA. INAPLICABILIDADE ÀS ELEIÇÕES GERAIS 2010. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ELEITORAL (ART. 16 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA...) (...)”

As decisões do TSE também devem respeitar a anterioridade eleitoral? O STF, no julgamento do RE nº 637.485/RJ decidiu que sim, as decisões do TSE quando, alterando o processo eleitoral, promoverem mudanças de entendimento jurisprudencial e repercutirem na segurança jurídica não podem ser aplicadas enquanto não houver o transcurso de 1 ano.

“(...) Em razão do caráter especialmente peculiar dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, os quais regem normativamente todo o processo eleitoral, é razoável concluir que a Constituição também alberga uma norma, ainda implícita, que traduz o postulado da segurança jurídica como princípio da anterioridade ou anualidade em relação à alternação da jurisprudência do TSE. Assim, as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral (ou logo após o seu encerramento), impliquem mudança de jurisprudência (e dessa forma repercutam sobre a segurança jurídica), não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior.” (RE nº637.485/RJ)

O STF, no julgamento da ADI 3.685, decidiu que a anualidade eleitoral também se aplica às emendas constitucionais.

Portanto, o princípio da anterioridade/anualidade eleitoral visa a evitar situações antiéticas advindas de possível atitude do legislador ao alterar as regras eleitorais às vésperas das eleições. Essas mudanças repentinas poderiam ser usadas para favorecer certos partidos e candidatos em prejuízo dos demais.

Princípio da Lisura Eleitoral

As eleições devem ocorrer de maneira transparente, com igualdade de oportunidades, e livre de abusos por parte dos candidatos, partidos e quem mais puder eventualmente se beneficiar de eventuais distorções na condução do pleito.

O princípio da lisura eleitoral pode se manifestar no ordenamento das seguintes formas:                        

- Proibição da captação ilícita de sufrágio (Lei das Eleições), vulgarmente conhecida como a compra de voto;

- Regras de desincompatibilização (Lei das Inelegibilidades), por exemplo quando dispõe-se que o(a) cônjuge do(a) presidente da República é inelegível, salvo se titular de mandato eletivo e candidato à reeleição; dentre outras.

Princípio da Moralidade Eleitoral

Princípio intimamente ligado ao princípio da lisura eleitoral. O princípio da moralidade exige que o mandato eletivo seja obtido de maneira lícita, normal, legítima, sem abusos econômicos, funcionais, corrupção ou fraude.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 14, faz menção ao princípio da moralidade para o exercício de cargos eletivos:

Art. 14. §9º - Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

§ 10 - O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude.

Dito isto, podemos ver que, tanto o princípio da lisura, quanto o princípio da moralidade buscam a defesa da ética no processo eleitoral.

Princípio da Autonomia Partidária:

Visa a garantir que os partidos políticos não sofram interferência estatal (do Brasil ou de Estado estrangeiro) em suas atividades.

Nosso sistema eleitoral tem como base a democracia representativa através de partidos políticos, ou seja, os candidatos estão sempre vinculados a determinado partido, sendo proibida a candidatura avulsa.

O princípio da autonomia partidária está disciplinado no artigo 17 da CRFB/88:

Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos:

I - caráter nacional;

II - proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes;

III - prestação de contas à Justiça Eleitoral;

IV - funcionamento parlamentar de acordo com a lei.

§ 1º É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.

Assim, o partido político deve ter caráter nacional, não podendo receber recursos financeiros de entidades/governos estrangeiros e não podendo ser subordinado a eles, pois tal violaria o preceito da soberania nacional.

CASO CONCRETO: ADI 2530 (Medida Cautelar): ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra o artigo 8º, §1º da Lei das Eleições – o partido deve ter autonomia para escolher seus candidatos.

“CANDIDATURA NATA. PRINCÍPIO DA ISONOMIA ENTRE OS PRÉ-CANDIDATOS. AUTONOMIA DOS PARTIDOS POLÍTICOS. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO §1º DO ART. 8º DA LEI 9.504, DE 30-9-1997, SEGUNDO O QUAL ‘§1º AOS DETENTORES DE MANDATO DE DEPUTADO FEDERAL, ESTADUAL OU DISTRITAL, OU DE VEREADOR, E AOS QUE TENHAM EXERCIDO ESSES CARGOS EM QUALQUER PERÍODO DA LEGISLATURA QUE ESTIVER EM CURSO, É ASSEGURADO O REGISTRO DE CANDIDATURA PARA O MESMO CARGO PELO PARTIDO A QUE ESTEJAM FILIADOS’. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 5º, CAPUT, E 17 DA CF. PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR DE SUSPENSÃO DA NORMA IMPUGNADA. PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DA AÇÃO (...)” (ADI 2.530-MC, REL. MIN. SYDNEY SANCHES, JULGAMENTO EM 24-4-2002, PLENÁRIO, DJ DE 21-11-2003)

Exemplo: caso um deputado estadual Beltrano de determinado partido esteja em seu último ano de mandato e queira concorrer novamente a este cargo mas seu partido, em comissão partidária, seleciona outros candidatos, excluindo o deputado Beltrano, este terá o direito de registro da candidatura? A decisão tomada em comissão partidária pode ser anulada? A literalidade do art. 8º daria a Beltrano o direito ao registro de candidatura e a decisão do partido poderia ser anulada. Entretanto, o STF decidiu, por medida cautelar, suspender essa norma sob o fundamento de que há plausibilidade jurídica na alegação de que o dispositivo impugnado viola o princípio da autonomia dos partidos, visto que os partidos devem ter autonomia para escolher seus candidatos em cada eleição, não ficando limitados por decisões tomadas em pleitos anteriores.

Princípio da Celeridade Eleitoral

Está ligado à rapidez que se exige na Justiça Eleitoral para a solução dos casos em tempo razoável. Como os mandatos são relativamente curtos e há eleições a cada 2 anos, as controvérsias devem ser resolvidas com a maior celeridade possível.

Desdobramentos da celeridade eleitoral:

a) Duração razoável do processo que possa culminar em perda de mandato eletivo: 1 ano (art. 97-A, Lei 9.504/97):

Art. 97-A. Nos termos do inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Federal, considera-se duração razoável do processo que possa resultar em perda de mandato eletivo o período máximo de 1 (um) ano, contado da sua apresentação à Justiça eleitoral.

Nesse sentido, o art. 5º da CRFB/88 dispõe sobre o princípio da celeridade:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:  LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Desta forma, sempre que o processo versar sobre a perda de mandato eletivo, o prazo máximo de sua duração é de 1 ano.

b) Preclusão imediata: nulidades devem ser impugnadas na primeira oportunidade, sob pena de preclusão.

Exemplo: se há dúvida quanto à identidade do eleitor no dia da votação. Desta forma, trata-se da perda do direito de suscitar nulidades no processo eleitoral.

c) Irrecorribilidade das decisões do TSE: as únicas decisões do TSE que são passíveis de recurso são aquelas que contrariam a constituição e as que denegam habeas corpus ou mandado de segurança. Fora essas hipóteses não é possível interpor-se recurso de decisões do TSE. Tal regra limita a quantidade de recursos que tramita no Tribunal Superior Eleitoral, priorizando o princípio da celeridade.

d) Tríduo recursal: em regra, os recursos eleitorais devem ser interpostos no prazo de 3 dias, isso porque os processos que tratam de matéria eleitoral devem ser céleres.

Princípio da Atipicidade Eleitoral 

Determina que a interpretação das normas, no direito eleitoral, não pode restringir direitos políticos quando a norma não prevê taxativamente tais restrições.

Na doutrina, esse princípio também é denominado de princípio in dubio pro eleitor ou in dubio pro candidato, visto que é uma espécie de presunção de que, havendo dúvida quanto à possibilidade de se restringir determinados direitos políticos, deve prevalecer o entendimento que melhor preserve tais direitos.

Outra denominação para o princípio da atipicidade é princípio do aproveitamento do voto, ligando-se à excepcionalidade das nulidades na aplicação da lei eleitoral, sobretudo no que concerne à votação, visando a preservar o voto diante de irregularidades que não comprometam o pleito. Nesse sentido, o Código Eleitoral apresenta os seguintes artigos:

Art. 219. Na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo.

Art. 149. Não será admitido recurso contra a votação, se não tiver havido impugnação perante a mesa receptora, no ato da votação, contra as nulidades arguidas.

Desta forma, as nulidades podem ser desconsideradas no processo eleitoral quando não puderem causar efetivo prejuízo.

Princípio da Responsabilidade Solidária

Há responsabilidade solidária entre candidatos e partidos quanto aos excessos praticados na propaganda eleitoral, conforme dispõe o artigo 241 do Código Eleitoral.

Art. 241. Toda propaganda eleitoral será realizada sob a responsabilidade dos partidos e por eles paga, imputando-lhes solidariedade nos excessos praticados pelos seus candidatos e adeptos.

Nesse sentido, caso um candidato apresente excesso em sua propaganda eleitoral, tanto ele quanto o partido serão responsabilizados, o que não significa que ambos responderão pela mesma multa. Serão aplicadas multas individuais, uma ao candidato e outra ao partido. Desta forma, a responsabilidade solidária diz respeito à propaganda eleitoral irregular e não à pena pecuniária.

Princípio da Soberania Popular

Segundo este princípio, cabe ao povo a legitimação do Poder estatal. O poder soberano é exercido pelos modos previstos na Constituição, que, em seu artigo 1º, dispõe:

Parágrafo único. Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Nesse sentido, o povo exerce o poder soberano de duas formas: direta ou indireta.

a) Direta: quanto ao exercício direto do poder soberano, vale destacar o artigo 14 da Constituição Federal:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

I - plebiscito;

II - referendo;

III - iniciativa popular.

O plebiscito e o referendo são consultas feitas ao povo a respeito de propostas legislativas.

  • Plebiscito é a consulta prévia, anterior ao ato normativo.
    • Exemplo: a decisão de divisão do Estado em Estados diferentes – caso de plebiscito, consulta prévia aos cidadãos.
  • Referendo é a consulta posterior à edição do ato normativo, devendo o povo decidir se ratifica ou rejeita tal ato.
    • Exemplo: o caso do artigo 35 do Estatuto do Desarmamento (2005) – cidadãos foram chamados para decidir sobre a vigência do referido artigo, a qual foi negada.

A iniciativa popular diz respeito à possibilidade do próprio povo redigir projetos de lei e submetê-los à apreciação do poder legislativo.

Há certas limitações à iniciativa popular:

  • no âmbito da União, o projeto de lei feito por iniciativa popular precisa estar acompanhado de assinaturas de 1% do eleitorado nacional distribuído por, ao menos, 5 estados com pelo menos 0,3% dos eleitores de cada um deles. A Constituição prevê a possibilidade de iniciativa popular somente para leis ordinárias e leis complementares, não havendo iniciativa popular de emendas constitucionais, apesar de boa parte da doutrina acreditar ser esta também possível.
  • no âmbito dos Estados, a Constituição deixou os requisitos da iniciativa popular em aberto, devendo o tema ser tratado por lei.
  • no âmbito Municipal, os projetos de lei devem ser acompanhados de 5% do eleitorado.

b) Indireta: indiretamente, o povo exerce seu poder por meio do sufrágio universal, elegendo seus representantes pelo voto direto para que estes atuem em nome do povo. Desta forma, quando a Câmara dos Deputados vota sobre determinado projeto de lei, o poder soberano do povo está sendo exercido.

Sufrágio é o direito de participação na escolha dos governantes – direito de votar e de ser votado. O sufrágio pode ser universal, restrito, igual ou desigual.

  • Universal: a participação política é ampla, atribuindo-se esta a grande parte da população.
  • Restrito: a participação no processo político é severamente limitada. O sufrágio restrito pode ser censitário/econômico – direitos políticos restritos àqueles com determinado grau de riqueza material; e capacitário/cultural – limita o exercício dos direitos políticos àqueles com determinado grau de instrução.
  • Igual: votos tem o mesmo valor.
  • Desigual: votos com valores diferentes.

O sufrágio adotado no Brasil é o sufrágio universal e igual.

Princípio Republicano

Relaciona-se diretamente com as características da República. Assim, determina que os membros do Executivo e do Legislativo devem ser escolhidos periodicamente pelo povo e que o cargo eletivo deve mudar de titular com periodicidade determinada.

Princípio da Periodicidade das Funções Eleitorais

As funções eleitorais do Juiz eleitoral e do Ministério Público Eleitoral são transitórias, ou seja, temporárias. Essas figuras atuam, em regra, por 2 anos, prazo passível de prorrogação por igual tempo.

A grande vantagem da periodicidade das funções eleitorais é a dificuldade que ela gera aos candidatos de influenciar e corromper juízes e promotores

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