PRINCÍPIOS

Princípio da Autonomia da vontade das partes:

A autonomia da vontade diz respeito à possibilidade de consenso entre as partes que são livres para tomarem decisões sobre a própria vida. Essa autonomia também pode ser chamada de liberdade das partes ou de autodeterminação, e ela é utilizada não só em relação ao conteúdo compactuado entre os interessados, mas também à escolha do procedimento a ser adotado na mediação, como pode ser observado no artigo 166, parágrafo 4 do CPC/2015. É necessário observar, ainda, que é necessário que as partes tenham capacidade, que a vontade não seja viciada e, ainda, que o compactuado seja legal, ou seja, que esteja plenamente dentro dos limites da lei.

*Resolução número 125, CNJ - Anexo III: Código de Ética de Mediadores e Conciliadores-Artigo 2º parágrafo 2º (trata sobre a autonomia da vontade das partes, estabelecendo que a decisão tomada pelos envolvidos deve ser livre e não coercitiva, podendo, inclusive, interromper o processo a qualquer momento.

Princípio da Voluntariedade e da Decisão Informada:

Esse princípio traz como base a dignidade da pessoa humana, na medida em que deve sempre observar o respeito físico e psíquico dos envolvidos, além do respeito aos mínimos existenciais (os mínimos existenciais representam a base alicerce da vida humana. Seriam o mínimo necessário à vida) e autodeterminação dos envolvidos. Nesse sentido, segundo o artigo 1º, II, do anexo III da Resolução 125/2010 do CNJ, é dever do mediador manter as partes informadas quanto aos seus direitos e deveres. É de se apontar que, analisando os caráteres acima mencionados, é possível reconhecer os sentimentos dos indivíduos e configurar a eles um poder de fato de tomada de decisões sobre a própria vida.

 OBS: quando há grande diferença de condição de poder entre as partes, a mediação não é possível! Isso se dá porque tal poderia configurar um aviltamento da dignidade, na medida em que os acordos podem ser estabelecidos com interesses externos à própria vontade, como exemplo: um empregado aceita o acordo com seu empregador para manter o emprego.

Princípio da Informalidade:

A informalidade traz a ideia de ausência de regras e procedimentos fixos. Essa medida se mostra essencial para naturalidade e relaxamento das partes para escolherem a melhor solução, além de permitir que não ocorra um engessamento do mediador diante das inúmeras possibilidades de solução de conflitos. Essa falta de formalidade não significa que não existam parâmetros mínimos necessários de observação, e é pra isso que serve a lei de mediação e os princípios que devem ser observados, deixando claro que a informalidade não significa falta de técnica ou de seriedade.

A seriedade e técnica podem ser observadas através da análise do artigo 167, parágrafo 1, do CPC, que impõe capacitação mínima por meio de curso realizado por entidade credenciada pelo tribunal. Apenas depois dessa capacitação é que ocorre o registro do mediador no tribunal e, assim, fará parte da lista de mediadores e poderá ser designado às mediações de forma aleatória.

Se os mediadores atuarem com dolo ou culpa na condução da mediação ou violarem qualquer dos deveres decorrentes do art. 166, §§ 1º e 2º CPC, art. 173, I; ou se atuarem em procedimento de mediação ou conciliação, apesar de impedidos ou suspeitos (art. 173, II CPC), os conciliadores e mediadores serão excluídos do respectivo registro. Essas duas medidas apontadas mostram a clara técnica e seriedade com que se trata a mediação.

 *Resolução 125, CNJ – Anexo III – Artigo 1º, parágrafo 6º – É necessária a observação desse artigo para que se deixe claro que a técnica existe na medida em as leis e a ordem pública devem ser respeitadas na solução estabelecida pelas partes.

Princípio da Independência:

Os mediadores devem atuar de forma livre sem nenhuma pressão interna e externa. É por esse motivo que não se pode medir o sucesso das mediações pelo número de acordos, ou seja, na mediação não se pode estabelecer metas a serem cumpridas. Mais vale um “não acordo” que traga um melhor resultado futuro para as partes do que um acordo que traga qualquer resultado prático ruim aos envolvidos.

*Resolução 125, CNJ – Anexo III – Artigo 1º, V – Trata sobre a independência dos mediadores e conciliadores e a não obrigação de redigir acordos ilegais.

Princípio da oralidade:

O princípio da oralidade demonstra a necessidade de comunicação entre as partes da escuta ativa, ou seja, uma escuta com o objetivo de compreensão do está sendo dito, e não apenas com o objetivo de resposta imediata e “contra-ataque”. Essa escuta ativa permite que haja reinterpretação do que é dito e a maior percepção das intenções do orador, através da observação dos gestos e entonações. O artigo 166 do CPC permite que a tratativa entre as partes seja feita de forma oral, não constando na ata de audiência. Ademais, a oralidade tem como objetivo conferir a celeridade ao procedimento, prestigiar a informalidade e ainda conferir a confidencialidade, na medida em que o que se restará escrito é pouca coisa.

 OBS: Mediação digital: Reflexão! Até que ponto esse tipo de mediação poderia trazer resultados práticos negativos? Trazer as propostas de acordo por escrito e sem a presença física pode resultar em interpretações equivocadas pelo leitor, fazendo com que o acordo não seja realizado adequadamente, por não se poder ter certeza das intenções da outra parte. Pessoalmente, é muito mais fácil de observar e de explicar o que se deseja compactuar.

Princípio da Imparcialidade e da Neutralidade:

O mediador deve ser imparcial e não pode atuar com a intenção de privilegiar uma das partes ou induzir a outra parte a uma solução que não atenda às suas legitimas vontades (equidistância em relação às partes e ausência de favoritismos). Nesse sentido, é importante que o mediador avise caso ele tenha estabelecido qualquer vínculo com alguma das partes envolvidas. As partes podem até aceitar continuar com esse mediador mesmo sabendo do vínculo existente entre ele e algum dos polos, mas é necessário que os envolvidos tenham conhecimento.

*Observar o artigo 1º, IV, do anexo III da Resolução 125/2010 do CNJ – artigo que fala sobre a necessidade de agir com ausência de favoritismos.

*Artigo 5º, parágrafo único, da Lei 13.140/2015 – artigo que fala sobre o dever do mediador revelar às partes qualquer fato ou circunstâncias que possa suscitar dúvida em relação a sua imparcialidade.

 OBS: ferramentas facilitadoras para ajudar o mediador a manter-se imparcial:

A) autoanálise e autoconhecimento – É necessário que o mediador sempre faça reflexões sobre si mesmo, com o objetivo de avaliar-se e reconhecer se sua participação na mediação se dará de forma parcial ou se de forma tendenciosa, o que prejudicaria a solução do conflito. Ora, deve o mediador visar à resolução que atenda a ambos os lados de forma gratificante.

B) co-mediação- Não é necessário que o mediador atue de maneira solo. É possível que, em determinados casos, uma equipe de psicólogos ou algum técnico em assuntos específicos prestem auxílio no processo da mediação. Esse terceiro-auxiliar ajuda na manutenção da imparcialidade do mediador, na medida em que dificulta que este comande a sessão baseando-se em convicções próprias ou estabeleça alianças com um dos polos.

É necessário que o mediador se declare impossibilitado de prosseguir caso sinta que sua atuação se dará de maneira parcial.

 OBS: Inércia e imparcialidade são coisas distintas. O mediador deve ser imparcial, mas isso não lhe tira o dever de agir com todas as técnicas necessárias com o objetivo de proporcionar um ambiente favorável à resolução do conflito. (artigo 166, parágrafo 3º do novo CPC).

Princípio da Cooperação e busca do consenso:

Esse princípio estabelece que o mediador deve buscar de forma cooperativa com as partes a solução do conflito, ainda que solucionar o conflito não seja o objetivo único da mediação.Ele deve usar técnicas de negociação e mediação como as ensinadas pelo modelo da escola de Harvard, quais sejam:

A) separar as pessoas dos problemas – não tratar o problema como algo inerente à pessoa.

b) buscar pelo interesse real – focar-se nos interesses propriamente ditos e não em posições pré-estabelecidas.

c) prezar por opções de ganho mútuo – tentar fazer com que as duas partes saiam satisfeitas, de alguma maneira, com o consenso.

d) utilizar critérios objetivos – ponderar as opções criadas de maneira que os interesses apes subjetivos e mágoas pessoais não tenham relevância para a propositura de soluções.

*CPC – artigo 166 parágrafo 3 e *lei de mediação artigo 2, IV

 ATENÇÃO! Busca do consenso é diferente de encontro do acordo (o objetivo não necessariamente é o acordo, mas, sim, a mudança da relação das partes e a abertura do diálogo saudável entre elas).

Nesse sentindo, o artigo 167, parágrafo 3º, é criticado, na medida em que ele estabelece que os mediadores devem ter em seu cadastramento informações importantes, incluindo o número de processos de que participou e ainda a quantidade de sucessos da atividade. Ora, se não é a quantidade e o número de acordos, mais importantes no objeto da mediação, como julgar a qualidade do mediador pelo número de acordos angariados?  Esse tipo de dispositivo pode fazer com que o mediador se sinta estimulado a tentar alcançar um acordo de qualquer maneira, atropelando os liames da decência, justiça, razoabilidade, etc, o que, obviamente, vai de encontro à essência da mediação.

 OBS: é importante frisar que a cooperação entre as partes não se restringe ao campo da mediação. É necessário que as partes cooperem e colaborem entre si também nos litígios judiciais comuns, como pode ser observado no artigo 6º do CPC. Isso fará com que a prestação jurisdicional ocorra da melhor maneira possível para ambos os polos, mesmo que a escolha do procedimento não tenha sido a mediação.

Princípio da Boa-fé:

O princípio da boa–fé caracteriza-se por uma convicção íntima do indivíduo de que a outra parte está agindo com lealdade, honestidade e justiça para alcançar uma salutar produtividade. Essa convicção permite que a mediação possa ser aplicada, uma vez que as partes só se submetem a esse procedimento caso acreditem que realmente há a boa vontade e cooperação do outro. O mediador também deve transparecer que está agindo de boa-fé, fazendo com que as partes confiem que estão adotando a melhor saída para a solução do conflito. Isso favorece o trabalho em conjunto das partes envolvidas.

Existem alguns traços subjetivos do indivíduo que podem indicar um agir de má-fé: Instabilidade emocional, ódio, desejo de punir a outra parte, ressentimento. Esses motivos trazem a clara percepção de elementos subjetivos que aproximam as pessoas do problema, indo de encontro com o trazido pela escola de Harvard. Nesse caso, é papel do mediador transformar o conflito e a relação das partes, na tentativa de transformar a competição em cooperação, utilizando-se de mecanismos para reduzir a desconfiança, aproximando-se dos ensinamentos trazidos pela escola transformativa. Nesse sentido, o mediador faz com que, no momento da crise que daria ensejo a um pensamento de “auto-centramento” (o indivíduo é levado a pensar apenas nele próprio e nos seus problemas e mágoas) e enfraquecimento da possibilidade de consenso, os problemas e as relações sejam transformados, aumentando a possibilidade de fortalecimento da solução e o reconhecimento pelo indivíduo das próprias limitações e motivos e interesses da parte contrária.

Princípio da Confidencialidade:

A confidencialidade é um princípio que confere a impossibilidade de qualquer informação obtida na audiência de mediação ser utilizada para outro fim que não a obtenção do consenso ou do que foi deliberado pelas partes. Ou seja, as informações só podem ser divulgadas se as partes deliberarem dessa maneira, e essa deliberação deve acontecer de maneira expressa. Há a possibilidade de que certas informações sejam passadas ao mediador de maneira separada, primeiro por uma parte e depois por outra, tendo o mediador o dever de não falar para a parte contrária o que lhe foi dito pela outra.

A confidencialidade favorece a boa – fé, diálogo, transparência e o favorecimento do compartilhamento, porque as partes sabem que aquilo sobre o que conversaram não poderá ser utilizado contra elas em nenhum procedimento judicial, nem por parte do mediador e nem por parte membro algum da equipe. A confidencialidade se refere a todas as informações produzidas durante o procedimento.

*Artigo primeiro parágrafo 1º, anexo III da Resolução nº 125, CNJ: fala sobre o dever de manter o sigilo sobre as informações obtidas na mediação, não podendo o mediador atuar como testemunha do caso, nem advogado caso o litígio caia em processo judicial.

 OBS: EXCEÇÕES DA CONFIDENCIALIDADE (olhar os artigos 30 e 31 da Lei 13.140/2015). Pode ser ignorado o dever de confidencialidade nas seguintes situações:
  1. Se as partes deliberarem por afasta-lo;
  2. Se, por algum motivo, a divulgação do caso for exigida por lei;
  3. Se for necessária a divulgação do caso para o cumprimento do acordo;
  4. Se houver informações relativas à ocorrência de crime de ação pública que possam afetar o caso;
  5. Se houver informações de interesses da administração tributária que não podem ser escondidas.

Princípio da Isonomia:

A isonomia é de ser considerada na medida em que as partes devem ser tratadas igualmente, tendo as mesmas oportunidades de manifestação e a mesma chance de participação. Nesse sentido, o mediador tem o dever de esclarecer as consequências da celebração, ou não, de um acordo; observar se as partes possuem condições e capacidades de consentir plenamente à solução apresentada, e facilitar a conversação equilibrada entre as duas partes.

Sobre a isonomia, ler o artigo 2º, II, da Lei 13.140/2015.

 OBS: E SE HOUVER DISPARIDADES DE PODER ENTRE AS PARTES? OU DISPARIDADE DE PERCEPÇÃO (entendimento equivocado da situação) OU ASSIMETRIA EXTREMA ENTRE AS PARTES (as duas partes sabem que uma delas encontra-se em posição muito mais fraca, é o caso da relação trabalhista). COMO O MEDIADOR DEVE AGIR? Ele pode, através da utilização de técnicas, tentar minimizar essa diferença.

Quais são essas técnicas profissionais? Dentre as mais usadas: 

  1. Auxílio na coleta e análise de dados;
  2. Identificação e mobilização de meios de influência sobre as partes;
  3. Educação da parte no planejamento da estratégia de negociação – explicar tudo (muito bem explicado) a ambas as partes, ajudando-as a lançar possibilidades objetivamente;
  4. Indicação de assistência por um advogado, se for o caso;
  5. Encorajamento tão somente de concessões realistas e oportunas.
 ATENÇÃO!!!! O mediador deve sempre informar às partes que não as pode orientar juridicamente, havendo necessidade de procurarem um advogado em caso de dúvidas, e que a assinatura de um acordo pode afetar seus direitos.

Em casos nos quais, mesmo utilizando-se as técnicas, a isonomia não for alcançada, a mediação deve preferivelmente ser encerrada, pois tentar promover o equilíbrio nesses casos pode gerar uma interferência muito direta do mediador, um “forçar a barra”, o que não é aconselhado, já que ficariam implícitos julgamentos e suposições por parte do mediador. Ora, estes não são encorajados, tendo em vista que a autodeterminação das partes é o quesito mais importante da mediação. Lembre-se de que o objetivo final não é o consenso, e sim a transformação do conflito (de forma positiva a ambas as partes na medida do possível).

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