PRINCÍPIOS DOS REGISTROS DE IMÓVEIS

Princípio da Inscrição

significa que os atos de constituição, transmissão e extinção de direitos reais só se operam “intervivos” e mediante sua inscrição no registro. Daí tem-se o dito popular de que “só é dono quem registra”.

A transmissão “causa mortis” é possível também, mas depende da inscrição para fins de disponibilidade. Podemos encontrar tais disposições nos arts. 1.227 e 1.245 do CC.

Na verdade, conclui-se que a alienação e a oneração de imóveis se constituem de dois elementos interligados: o título, que expressa a vontade das partes, e o registro, que cria o direito real e da conhecimento do que foi acordado a terceiros. É como se esses dois elementos formassem um só ato complexo realizado, portanto, em dois estágios: um escritural e outro registral.

Saisine X Transferência: o Princípio de Saisine, de origem francesa, estabelece que a posse dos bens do de cujus (o falecido) transmite-se aos herdeiros imediatamente, na data de sua morte. Esse princípio foi consagrado em nosso ordenamento jurídico pelo art. 1.784, do Código Civil.

Na perspectiva registral, pensamos que a saisine também se reflete diretamente no universo cartorário, já que há uma sub-rogação legal dos sucessores, que passam a ocupar o lugar do de cujus, isto é, os sucessores se investem plenamente no lugar do defunto.

Desmembramento de circunscrição - desnecessidade de inscrição no novo cartório

Um dos principais objetivos da lei 6.015/73 foi assegurar que cada imóvel passasse a ter uma matrícula própria, individualizada, levando-se em conta os princípios da continuidade e da especialidade.

A abertura de uma mesma matrícula para mais de um imóvel, destarte, tornou-se clara afronta a esses objetivos. O artigo 176, § 1º, I da LRP vem estabelecer em definitivo que um imóvel não pode ser matriculado mais de uma vez.

Para o desmembramento da serventia, é indispensável o devido acompanhamento e a comunicação de abertura de matrícula na nova serventia. Sem isto, matrículas diversas de um mesmo imóvel seriam passíveis de receber, simultânea e concomitantemente, atos de averbação capazes de alterar uma realidade fática e comprometer a segurança das transações jurídicas e dos atos negociais realizados em torno do referido imóvel.

Morte/Incapacidade antes do Registro

Adquiri um imóvel, o vendedor faleceu antes da transferência da propriedade! E agora?

Caso se compre qualquer tipo de imóvel, é melhor que se realize imediatamente a transferência da propriedade com a elaboração da escritura pública e que se registre o feito. Em caso hipotético de promitente vendedor que veio a falecer, desaparecer ou que se recuse a assinar a escritura pública de compra e venda, há uma saída.

Através da ação de adjudicação compulsória, pode-se requerer judicialmente a emissão da carta de adjudicação (a qual será emitida na sentença), ainda que não realizado o registro do contrato em cartório. Assim torna-se possível solicitar, junto ao Cartório de Registro de Imóveis, a lavratura da escritura pública e, consequentemente, a aquisição da propriedade.

Princípio da Instância

Desse princípio, extraímos a regra de que, apesar da obrigatoriedade do registro prevista no art. 169, da Lei 6.015/73, o Oficial somente poderá praticar o ato a pedido do interessado (por escrito ou verbal), sem prejuízo das anotações e averbações obrigatórias que couberem. Ressalva-se que, tal qual estabelece o art. 13, o registro também poderá ser levado a efeito por determinação judicial ou a requerimento do MP, quando a lei assim autorizar.

Mas veja, como é muito comum de acontecer no direito, a dada regra traz exceções (quando o Oficial pode praticar os atos de ofício):

  • Averbação dos nomes dos logradouros decretado pelo Poder Público,
  • Retificação de registro ou averbação – art. 213, LRP

Princípio da Legalidade

Tem como objetivo impedir que sejam registrados títulos inválidos, ineficazes ou imperfeitos.

Quando um título é apresentado para ser registrado, ele é examinado à luz da legislação em vigor (ou que jazia vigente na época de sua firmação) e, havendo exigências ainda serem cumpridas, o oficial as indicará por escrito, conforme preceitua o artigo 198 da Lei Federal nº 6.015/73.

Então, tem-se que a validade do registro de um título diz respeito à validade do próprio negócio jurídico causal. Nulo o negócio, nulo será o registro. Anulado o negócio, anulado deverá ser o registro.

Princípio da Prioridade

O título prenotado é aquele que é lançado no Livro de Protocolo e gera a prenotação, isto é, o número de ordem, determinando a prioridade do registro.

O princípio da prioridade preleciona que, se dois ou mais títulos forem apresentados com pretensões contraditórias, a preferência do registro deve ser determinada pela prioridade dele, isto é, pela ordem cronológica da apresentação dos títulos.

A questão principiológica pode ser explicitada pelo exemplo a seguir: quando alguém vende um imóvel a dois ou mais compradores, surgem pretensões contraditórias incompatíveis com a natureza dos direitos reais. Segundo o princípio da prioridade, o título a ser registrado deve ser aquele que primeiro ingressar no protocolo, e devolvido os outros com os motivos da recusa.

Este princípio está disposto no art. 186 da Lei de Registros Públicos (LRP):

Art. 186. O número de ordem determinará a prioridade do título, e esta, a preferência dos direitos reais, ainda que apresentados pela mesma pessoa mais de um título simultaneamente

A prenotação tem prazo de 30 dias. Caso ela não ocorra por culpa do interessado, um possível segundo interessado que houver toma o lugar daquele primeiro na ordem de prioridade.

Um ponto que gera dúvida é acerca da prioridade dos idosos, conforme disposto no Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003). O estatuto garante prioridade no atendimento de idosos em órgãos públicos e privados prestadores de serviços à população, nos quais se inserem os cartórios. Tal encontra-se em seu art. 3º, I. Essa prioridade, no entanto, dá-se quanto ao atendimento preferencial, e não quanto à ordem de prenotação dos títulos apresentados para registros. Estes continuam sob a orientação do art. 186 da LRP.

Outro ponto também importante é a hipoteca de segundo grau. Se um título apresentado a registro mencionar uma hipoteca anteriormente não registrada, o oficial deverá sobrestar o registro da nova hipoteca, concedendo o prazo de 30 dias para que o interessado proceda o registro da primeira hipoteca. Caso ela não seja registrada, a segunda hipoteca passa a ter preferência obre a anterior.

Princípio da Especialidade

O princípio da especialidade se refere à especificação do imóvel e das partes que acordam sobre ele. Divide-se em especialidade objetiva e subjetiva.

A especialidade objetiva significa que toda inscrição deve recair sobre um imóvel individuado (não apenas o imóvel deve ser individuado, mas também as dívidas garantidas devem ser especificadas – juros, formas de pagamento, etc.)

A especialidade subjetiva é a qualificação específica dos sujeitos participantes dos atos registrais (CPF, RG, estado civil).

Princípio da Cindibilidade

Este princípio consiste na possibilidade de se registrar apenas parte dos objetos constantes do título. É a possibilidade de separar os elementos do título para que apenas parte dele seja registrado. (Lembrando que cisão significa divisão, separação, e, por tanto, a cindibilidade é a separabilidade).

Podem ser cindidos:
a) as escrituras de compra e venda de imóvel noticiando a existência de construção ainda não averbada no Livro 2 e
b) o formal de partilha.

Não podem ser cindidos:
a) a escritura pública de dação de imóveis em pagamento com a liberação de garantia de outros imóveis (não pode ser registrado a dação em pagamento sem o registro da liberação da hipoteca),
b) a fração ideal e
c) a permuta de imóveis.

Princípio da Continuidade

Esse princípio se apoia no princípio da especialidade, pois cria uma cadeia de titularidades, somente permitindo a inscrição de um direito se o outorgante for o proprietário. Isto é, Alfredo só pode transmitir um imóvel para Borba se Alfredo for o proprietário do imóvel. A ideia do princípio é criar uma corrente ininterrupta de assentos cuja finalidade é assegurar a segurança jurídica dos atos registrais.

Está previsto no art. 195 da LRP, conforme o disposto: 

Art. 195 - Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.

É dividido em aspecto objetivo (que se refere ao imóvel) e subjetivo (que se refere às pessoas envolvidas no ato registral, isto é, outorgante e outorgado).

Caso específico da promessa de compra e venda e sua cessão.

Alfredo promete a Borba a venda de um imóvel propriedade sua. Se a promessa não for registrada, ela há de constituir-se apenas como um direito obrigacional, de forma que não cria uma cadeia de assentos no registro do imóvel e, por isto, não se faz oponível contra terceiros de boa-fé. Nesse caso, o direito de Borba a comprar o imóvel em tela não pode ser oponível caso um terceiro subsequente celebre o mesmo negócio com Alfredo, mas o registre. Em havendo o registro da compra e venda, caso Borba quisesse desembaraçar-se desta obrigação, deveria registrar a cessão desse direito a um terceiro.

Em resumo: sem o registro, a promessa de compra e venda é apenas um direito obrigacional. Como registro, ela se torna um direito real.

Exceções ao princípio da continuidade

A LRP prevê algumas exceções ao princípio da continuidade, vejamos:

Art. 195-A. O Município poderá solicitar, ao cartório de registro de imóveis competente, a abertura de matrícula de parte ou da totalidade de imóveis públicos oriundos de parcelamento do solo urbano implantados, ainda que não inscritos ou registrados, por meio de requerimento acompanhado dos seguintes documentos: (...)

Art. 195-B. A União, os Estados e o Distrito Federal poderão solicitar ao registro de imóveis competente a abertura de matrícula de parte ou da totalidade de imóveis urbanos sem registro anterior, cujo domínio lhe tenha sido assegurado pela legislação, por meio de requerimento acompanhado dos documentos previstos nos incisos I, II e III do caput do art. 195-A, inclusive para as terras devolutas, dispensado o procedimento discriminatório administrativo ou judicial.

Art. 213, § 13. Não havendo dúvida quanto à identificação do imóvel, o título anterior à retificação poderá ser levado a registro desde que requerido pelo adquirente, promovendo-se o registro em conformidade com a nova descrição. (o pedido deve ser por escrito e somente do adquirente, não podendo ser feito pelo alienante ou apresentante).

Pergunta: o princípio da continuidade obsta a lavratura de atos do tabelião?

Não. A doutrina entende que o tabelião pode registrar a transferência de imóvel de um proprietário que não conste na matrícula. O tabelião deve recomendar que o outorgante registre seu título aquisitivo no cartório competente, mas isso não impede que, ao outorgado, seja transferida a propriedade do imóvel.

Polêmica da arrematação judicial

Desde de 2010, existe uma polêmica envolvendo decisões contraditórias da corregedoria envolvendo a arrematação judicial de imóveis. Enquanto algumas decisões vinham no sentido de que a arrematação era título originário, outras, em sentido contrário, entendiam que era título derivado.

Sendo um título derivado, deve-se seguir a lógica do princípio da continuidade que determina a cadeia ininterrupta de assentos, diferentemente do título originário, que foge a essa regra.

A decisão mais recente foi no sentido de reconhecer a natureza derivada do título, ancorado no brocardo de que “ninguém pode transmitir mais direitos do que tem”. Isso significa que o adquirente recebe o imóvel livre dos ônus sub-rogados no preço da alienação. No entanto, servidões, usufrutos, e outros gravames, permanecem no imóvel.

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