Contrato de Trespasse

Conceitos

O contrato de Trespasse consiste na alienação de um estabelecimento comercial.

O Código Civil apresenta o conceito de estabelecimento, o que se verifica em seu artigo 1.142:

Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária.

§ 1º O estabelecimento não se confunde com o local onde se exerce a atividade empresarial, que poderá ser físico ou virtual.

§ 2º Quando o local onde se exerce a atividade empresarial for virtual, o endereço informado para fins de registro poderá ser, conforme o caso, o do empresário individual ou o de um dos sócios da sociedade empresária.

§ 3º Quando o local onde se exerce a atividade empresarial for físico, a fixação do horário de funcionamento competirá ao Município, observada a regra geral do inciso II do caput do art. 3º da Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019.

Logo, o estabelecimento é um complexo de bens funcionalmente destinados ao exercício da atividade econômica. Isso implica dizer que todos os bens que integram o estabelecimento são indispensáveis ao regular exercício da atividade empresarial, compondo-se pelos bens materiais (móveis, maquinários etc.) e imateriais (marca, ponto empresarial etc.).

O contrato de trespasse só se implementa quando a transferência de bens importar a transmissão da funcionalidade do estabelecimento comercial, de acordo com o enunciado 233 da III Jornada de Direito Civil:

233 – Art. 1.142: A sistemática do contrato de trespasse delineada pelo Código Civil nos arts. 1.142 e ss., especialmente seus efeitos obrigacionais, aplica-se somente quando o conjunto de bens transferidos importar a transmissão da funcionalidade do estabelecimento empresarial.

Requisitos

Como o estabelecimento comercial cumpre uma função social, a sua alienação (o trespasse) está sujeita a alguns requisitos especiais:
  • Registro do Contrato e publicação na Imprensa Oficial:

Art. 1.144. O contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial.

A publicação na imprensa oficial é dispensada para o trespasse de ME e EPP.
  • Anuência dos credores (se não restarem bens suficientes para resolver o passivo). Se o empresário devedor não dispuser de patrimônio suficiente para garantir suas pendências frente aos seus credores, o trespasse apenas terá eficácia na hipótese de pagamento de todos os credores, a menos que esses consintam com o negócio de modo expresso ou tácito.

Sub-rogação automática pelo adquirente nos contratos

Art. 1.148: Salvo disposição em contrário, a transferência importa a sub-rogação do adquirente nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento, se não tiverem caráter pessoal, podendo os terceiros rescindir o contrato em noventa dias a contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa, ressalvada, neste caso, a responsabilidade do alienante.

O contrato de trespasse se orienta pela preservação da empresa, assim, o adquirente do estabelecimento poderá continuar o exercício da atividade valendo-se dos contratos firmados pelo adquirente, assumido automaticamente sua posição nos contratos.

A exceção são os contratos personalíssimos, como o contrato de locação que não admite a sub-rogação automática. Neste caso, as partes contratantes devem ajustar a cessão contratual.

Sucessão Empresarial

Além de cumprir com todas estas formalidades, havendo necessidade de pagamento do passivo ou obtendo-se consentimento de todos os credores, as partes do trespasse continuam vinculadas aos débitos constituídos antes da transferência, esta é a exegese do art. 1.146 CC.

Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento.

Vale lembrar que, por disposição da lei de falências, este dispositivo não se aplica aos estabelecimentos adquiridos por leilão judicial ocorrido nos processos de recuperação judicial e falência.

Cláusula de não-concorrência ou não-reestabelecimento

De acordo com o art. 1.147 do CC, o alienante do fundo somente poderá concorrer com o adquirente caso exista autorização expressa neste sentido no contrato.

Art. 1.147. Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subsequentes à transferência.
Parágrafo único. No caso de arrendamento ou usufruto do estabelecimento, a proibição prevista neste artigo persistirá durante o prazo do contrato.

A finalidade do dispositivo é “impedir que o alienante do estabelecimento venha a disputar o mercado com o adquirente, comprometendo o potencial de lucratividade (aviamento) inerente à universalidade patrimonial adquirida”.

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