Infração Disciplinar e Penas

INFRAÇÃO DISCIPLINAR E PENAS

A infração disciplinar, prevista no artigo 156 do CBJD, consiste em uma ação ou omissão antidesportiva, típica e culpável, nos termos desse artigo. Ser antidesportiva significa que é contrária à norma do desporto. Ser típica, por sua vez, significa que é legalmente prevista. Por fim, deverá ser culpável, ou seja, é possível fazer um juízo de censurabilidade e reprovação quanto à conduta do infrator.

Novamente, são percebidos institutos e características semelhantes ao Direito Penal, conforme estudado na aula sobre princípios. Entretanto, é importante frisar que são matérias distintas (Direito Desportivo ≠ Direito Penal), não constituindo crimes as infrações disciplinares.

TIPOS DE INFRAÇÕES

Há quatro tipos básicos de infrações, de acordo com o texto do artigo 157 e incisos do CBJD. A primeira delas é a consumada, quando se reúnem, no ato praticado, todos os elementos de sua definição. Outra modalidade de infração é a tentada, a qual ocorrerá nas situações em que, iniciada a execução, acaba por não se consumar por circunstâncias alheias à vontade do agente.

O terceiro tipo de infração é a dolosa, configurada quando o agente quis o resultado ou, ainda que não o quisesse, assumiu o risco de produzi-lo. Por fim, a infração pode ser culposa, nos casos em que o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

A abordagem da tentativa é aprofundada nos §§ 1º,2º e 3º do artigo 157 da CBJD. No §1º está determinado que a infração tentada será punida com pena correspondente à infração consumada, reduzida da metade, salvo disposição em contrário. Em outras palavras, a tentativa é punida com metade da pena prevista para a infração consumada.

No §2º, por sua vez, versa sobre a infração impossível. Não será punida a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, seja impossível consumar-se a infração.

O texto do §3º, por fim, traz a determinação de que, salvo disposição expressa em contrário, o ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio não são puníveis se a infração não é ao menos tentada. Ou seja, a regra geral é a de que não há punição para o ato de pensar sobre o cometimento de uma infração se a sua prática não for sequer tentada.

EXCLUDENTES DE PUNIBILIDADE

Há basicamente três excludentes de punibilidade: a coação irresistível (art. 160, CBJD), o estrito cumprimento do dever legal (art. 160, CBJD) e a inexigibilidade de conduta diversa (art. 161, CBJD). Nas duas primeiras hipóteses, apenas o autor da ordem ou coação será punível. A leitura dos termos dos artigos é interessante para a compreensão das previsões; desse modo, seguem os artigos com grifos nossos.

Art. 160. Se a infração é cometida em obediência à ordem de superior hierárquico, não manifestamente ilegal, ou sob coação comprovadamente irresistível, só é punível o autor da ordem ou da coação.

Art. 161. Não há infração quando as circunstâncias que incidem sobre o fato são de tal ordem que impeçam que do agente se possa exigir conduta diversa.

 Como exemplos do previsto no artigo 161 da CBJD, podem-se considerar um desabamento do estádio ou, conforme abordado em aula, a invasão de campo em caso de atentado terrorista. Nesses casos, torcedores ou jogadores escapando de uma situação de risco não poderão ser punidos por sua conduta, que não poderia ser diferente para que suas vidas e suas integridades físicas fossem preservadas.

APARECEU NA MÍDIA! O atentado que ocorreu no dia 13 de novembro de 2015, citado em aula, fez com que Fraçois Hollande fosse retirado do jogo de futebol entre França e Alemanha durante o segundo tempo do jogo, devido a explosão de bombas ao redor do estádio onde o jogo ocorria. Nesse sentido, os milhares de torcedores invadiram o gramado em busca de abrigo, até que lhes fosse garantida a segurança pela força policial. Especialmente considerando os sucessivos ataques terroristas ocorridos em território europeu, não se poderia exigir conduta diversa dos torcedores, os quais justificadamente temiam por suas vidas. Fonte: http://globoesporte.globo.com/futebol/futebol-internacional/noticia/2015/11/presidente-da-franca-tem-que-deixar-amistoso-apos-explosoes-perto-de-estadio.html

OUTROS ASPECTOS DAS INFRAÇÕES

O erro quanto à pessoa não afasta a inimputabilidade do agente. Nos termos do artigo 159 do CBJD, “o erro quanto à pessoa contra a qual a infração é praticada não isenta o agente de pena”. Ou seja, se um atleta tenta agredir o atleta A e acaba por desferir um soco contra o atleta B, ainda assim sofrerá a penalidade cabível.

Outra importante previsão é a de que as pessoas naturais responsáveis pelas infrações cometidas pelas pessoas jurídicas são igualmente imputáveis. Nos termos do artigo 161-A da CBJD, caput, “a responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas naturais, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato”.

De acordo com o parágrafo único do mesmo artigo, “a pessoa natural responsável pela infração cometida por pessoa jurídica será considerada co-autora”. Ou seja, a pessoa natural responsável pela pessoa jurídica responderá conjuntamente com a pessoa jurídica por quaisquer infrações cometidas em nome desta.

Quanto à inimputabilidade, a previsão é que o atleta é desportivamente inimputável até que complete quatorze anos de idade, estando sujeitos à orientação de caráter pedagógico (art.161-A, caput, CBJD). Caso haja reincidência do menor de quatorze anos, quem responderá em seu lugar será o seu técnico ou representante legal na respectiva competição, caso as medidas cabíveis para orientar e inibir novas infrações não tenham sido adotadas por essas figuras responsáveis (art.161-A, parágrafo único, CBJD).

EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE

A extinção da punibilidade poderá ocorrer em cinco hipóteses, de acordo com o disposto no artigo 164 do CBJD. A punibilidade poderá ser extinta em virtude da morte da pessoa natural infratora e, igualmente, pela extinção da pessoa jurídica infratora. Caso haja retroatividade da norma que não mais considera o fato como infração, também haverá extinção da punibilidade, havendo prevalência da norma mais benéfica ao infrator. A prescrição da infração constitue a última causa de extinção da punibilidade previstas no CBJD para os processos disciplinares desportivos. Anteriormente, a reabilitação do infrator também constituía uma forma de extinção da punibilidade. Entretanto, a Resolução CNE nº 29 de 2009 revogou essa possibilidade. 

PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA

A prescrição da pretensão punitiva ocorrerá em cinco hipóteses e prazos distintos, previstas no artigo 165-A do CBJD. A prescrição da pretensão punitiva disciplinar da Procuradoria relativa às infrações previstas nos arts. 250 a 258-D do CBJD (infrações relativas à disputa das partidas – ex.: agressões, ofensas à honra etc.) ocorrerá no prazo de 30 (trinta) dias.

As infrações que não tenham previsão expressa no CBJD estarão submetidas ao prazo geral (comum/residual) para prescrição da pretensão punitiva disciplinar da Procuradoria, qual seja, 60 (sessenta) dias.

Prescreverá em dois anos a pretensão ao cumprimento das sanções. Esse prazo será contado do trânsito em julgado da decisão condenatória. Os casos de pretensão punitiva disciplinar relativa a infrações por dopagem, por outro lado, prescreverão no prazo de oito anos, a menos que haja disposição diversa na legislação internacional que trate da matéria.

Por fim, prescreverá em vinte anos a pretensão punitiva disciplinar relativa às infrações previstas nos artigos 237 e 238 do CBJD, ou seja, dar ou receber vantagem indevida. Nos casos de corrupção, portanto, a prescrição ocorrerá após vinte anos.

Importante mencionar que, com a vigência da Lei 14.529 de 2023, a nova Lei Geral do Esporte, a corrupção passou a ser considerada crime contra a ordem econômica esportiva, prevista no art. 165 da referida lei, sendo punida na esfera administrativa e criminal: 

Art. 165. Exigir, solicitar, aceitar ou receber vantagem indevida, como representante de organização esportiva privada, para favorecer a si ou a terceiros, direta ou indiretamente, ou aceitar promessa de vantagem indevida, a fim de realizar ou de omitir ato inerente às suas atribuições:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem oferece, promete, entrega ou paga, direta ou indiretamente, ao representante da organização esportiva privada, vantagem indevida. 

O exemplo clássico de corrupção em esportes são as malas branca e preta. A corrupção da “mala preta” ocorre quando é oferecido dinheiro a uma equipe para que ela perca de propósito. No caso da “mala branca”, a corrupção se dá para que uma equipe se desempenhe melhor sua atividade desportiva; seria como um “estímulo” para a equipe ganhar. Contudo, esse “estímulo financeiro” constitui vantagem indevida, sendo passível de punição

APARECEU NA MÍDIA: Copa de 1978 - O caso mais famoso de mala preta ocorreu na Copa de 1978, quando a Argentina precisava vencer o Peru por quatro gols de diferença para passar o Brasil e chegar à final da competição. Filho de narcotraficante, o escritor colombiano Fernando Mondragón revelou que existiu um acordo envolvendo o pagamento de cerca de US$ 300 mil para a equipe peruana, com o apoio da Casa Rosada e de cartéis de drogas. Fonte: http://super.abril.com.br/saude/entregamos-a-copa/

Os prazos prescricionais abordados serão contados da forma disposta no texto do §6º do artigo 165-A do CJBD. A contagem da prescrição começa do dia que a infração se consumou, em caso de infração consumada; do dia em que cessou a atividade infracional, no caso de tentativa; do dia em que cessou a permanência ou continuidade, no caso das infrações permanentes ou continuadas; e, por fim, do dia em que o fato se tornou conhecido pela Procuradoria, nos casos em que a infração, por sua natureza, só puder ser conhecida em momento posterior àqueles mencionados nas alíneas anteriores, como nos casos de falsidade.

ASPECTOS INTERNACIONAIS

Importante aspecto específico das normas da Justiça Desportiva é a internalização das normas internacionais, prevista no §1º do artigo 1º da Lei Pelé. De acordo com o previsto nesse artigo, em seus termos, “a prática desportiva formal é regulada por normas nacionais e internacionais e pelas regras de prática desportiva de cada modalidade, aceitas pelas respectivas entidades nacionais de administração do desporto”.

Desse modo, se a entidade nacional de administração do desporto aceita a regra internacional, as sanções aplicáveis pelo CBJD também deverão incluir as regras da modalidade. Um excelente exemplo é o dos portões fechados no futebol, pois esse caso não é expressamente previsto nem na Lei Pelé e nem no CBJD, mas está previsto na norma internacional da Federação Internacional de Futebol (FIFA).

Nesse sentido, importante ressaltar que a aplicação de sanção inclui as regras específicas da modalidade, além das regras desportivas gerais.

TIPOS DE PENA

Quanto às penas passíveis de serem aplicadas no âmbito desportivo, essas estão previstas nos incisos do §1º do artigo 50 da Lei Pelé, o qual encontra correspondência de conteúdo com o artigo 170 do CBJD. São onze as hipóteses previstas nesses artigos, quais sejam: advertência, eliminação, exclusão de campeonato ou torneio, indenização, interdição de praça de desportos, multa, perda do mando do campo, perda de pontos, perda de renda, suspensão por partida e suspensão por prazo.

Além dessas penalidades, existem algumas específicas para os casos de violação às regras antidopagem, previstas nos incisos do artigo 50-A da Lei Pelé. São estas: a nulidade de títulos, premiações, pontuações, recordes e resultados desportivos obtidos pelo infrator, bem como a devolução de prêmios, troféus, medalhas e outras vantagens obtidas pelo infrator que estejam relacionadas à prática desportiva.

Nos casos em que haja condenação em suspensão por prazo determinado, se a infração cometida foi a de violação das regras antidopagem, a Justiça Desportiva Antidopagem comunicará aos órgãos da administração pública para que esta possa buscar obter ressarcimento de recursos públicos despendidos com o atleta.

Isso porque os atletas podem receber bolsas pelo programa de bolsas a atletas concedidas pelo Governo Federal. Em caso de dopagem, esse dinheiro público poderá ser reavido pela Administração Pública. Essas previsões constantes no artigo 50-A foram inseridas na Lei Pelé no ano de 2016, por meio da Lei nº 13.322/2016.

ADVERTÊNCIA E SUSPENSÃO POR PARTIDAS

A pena de advertência deve ser prevista legalmente como pena de uma infração disciplinar específica, com um período de anterioridade de seis meses. Desse modo, se o infrator foi beneficiado com a pena de advertência seis meses antes, não poderá se beneficiar dela novamente nesse período (art. 170, §5º).

A pena de suspensão por partidas deve ser cumprida na mesma competição (art. 171, CBJD). Se a competição estiver sendo finalizada, o time for desclassificado ou houver outras hipóteses que façam com que não seja possível cumprir essa pena na mesma competição, ela deverá ser aplicada na próxima partida ou prova de competição subsequente organizada pela mesma EAD. Outra opção, em caso de impossibilidade de cumprimento da suspensão na mesma competição, é a conversão dessa pena em medida de interesse social, mediante requerimento e a critério do Presidente do Tribunal competente (art. 171, §1º, CBJD).

Se a suspensão por partida devesse ser determinada em virtude de infração específica, mas esta for cometida em partida amistosa, a suspensão será cumprida quando houver partida não amistosa de mesma natureza ou convertida em medida de interesse social (art. 171, §2º, CBJD).

Outras observações relevantes sobre a pena de suspensão é que ela não poderá ser superior a 24 (vinte e quatro) partidas, provas ou equivalentes. Ademais, o cômputo da pena é sempre suspenso se o infrator se transferir para o exterior, exceto se consumada a prescrição.

SUSPENSÃO POR PRAZO

A suspensão por prazo tem suas consequências previstas no texto do artigo 172 do CBJD, pelo qual “a suspensão por prazo priva o punido de participar de quaisquer competições promovidas pelas entidades de administração na respectiva modalidade desportiva, de ter acesso a recintos reservados de praças de desportos durante a realização das partidas, provas ou equivalentes, de praticar atos oficiais referentes à respectiva modalidade desportiva e de exercer qualquer cargo ou função em poderes de entidades de administração do desporto da modalidade e na Justiça Desportiva”.

Seu alcance é maior que o da suspensão por partida porque impede o infrator de participar no meio do desporto, pois sua infração poderia interferir no funcionamento do esporte em geral.

Essa modalidade de pena poderá ser substituída à metade pelo cumprimento de medida social, à critério do Presidente do órgão judicante. Além disso, a pena não poderá exceder o prazo de 720 (setecentos e vinte) dias, sendo seu cômputo suspenso quando há transferência para o exterior, exceto se consumada a prescrição. Em períodos sem competição, a critério do Presidente do órgão judicante, o cômputo também poderá ser suspenso. (§§1º, 2º, 3º e 4º do artigo 172, CBJD)

INTERDIÇÃO E PERDA DE MANDO DE CAMPO

A interdição da praça de desporto (art. 174, CBJD) é sempre feita pelo órgão judicante e será mantida até que as exigências determinadas por aquele órgão sejam atendidas. Essa é a função dessa medida – manter a praça de desporto fechada até que sejam cumpridas as exigências determinadas nessa decisão do órgão judicante.

A perda de mando de campo (art. 175, CBJD), a qual significa que um time (no caso do futebol, por exemplo) não poderá jogar no seu estádio, é válida para a competição na qual for cometida a infração. Caso não seja possível cumprir na mesma competição, deverá ser cumprida na partida subsequente da competição organizada pela mesma EAD (art. 175, §1º, CBJD). O cumprimento da pena de perda de mando de campo, além de ser responsabilidade do infrator (que poderia ser punido por descumprimento da determinação), será também de responsabilidade da EAD (art. 175, §2º, CBJD). Para isso, deve haver previsão regulamentar da competição específica sobre como funcionará a pena de perda de mando de campo.

PENA PECUNIÁRIA

A pena pecuniária, prevista no artigo 176-A do CJBD, tem prazos e condições estabelecidas pelo Presidente do Tribunal, sendo geralmente efetuados em uma tabela unificada no começo de cada ano. O cumprimento da pena pecuniária deverá ser comprovado nos autos.

Assim como em outras penas estudadas anteriormente, a pena pecuniária poderá ser substituída à metade por medida de interesse social, a critério do Presidente do órgão judicante. Poderá, ainda, ser parcelada, a requerimento ou de ofício, também pelo Presidente do órgão judicante, o que geralmente ocorre nos casos de EPDs menores, sem condições financeiras para adimplemento imediato.

O valor determinado a título de pena pecuniária será devido solidariamente entre a EPD e as pessoas naturais que tenham sido punidas, ainda que haja desligamento do atleta ou outro infrator.

PENA DE ELIMINAÇÃO

A pena de eliminação constitui a pena mais grave do CBJD, prevista no art. 177 do CBJD. Equivale ao banimento ou afastamento completo da pessoa do esporte – o infrator não poderá participar de qualquer outra atividade desportiva em todo o território nacional. Ressalve-se que essa pena não se aplica à pessoa jurídica (art. 170, § 4º, CBJD).

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